“O coração das mães é um abismo no fundo do qual se encontra sempre um perdão.”
Honoré de Balzac (1799 – 1850)
A morte da minha mãe, recentemente, me trouxe à lembrança os registros que guardei dela, em minha memória. Da disposição em sacrificar-se pelos filhos à alegria de preparar algo para suprir uma necessidade ou simplesmente agradar um filho, tudo me veio à lembrança. E isso me fez pensar no tipo de mãe que tenho sido e em como estou ajudando minhas filhas a construírem a memória que terão de mim…
Lembrarão de uma mãe que reclama do trabalho de cuidar das filhas ou uma mãe que tem prazer em cumprir seu papel nas vidas delas? Alguém que ama ser mãe ou para quem a maternidade é um peso?
Já faz um tempinho que as funções ligadas à maternidade e ao cuidado do lar estão em baixa na sociedade. As mulheres são valorizadas por seus feitos no trabalho fora de casa e estimuladas a desgostarem de qualquer tarefa relacionada ao cuidado dos filhos e ao lar. E, nessa correria de tentar trabalhar fora e cuidar de uma família, quase sempre estamos cansadas demais para exercer a maternidade e todas as suas implicações com disposição e contentamento. Junto com o cansaço vem a impaciência, a reclamação, a inabilidade para aproveitar cada momento que gastamos para e com nossos filhos.
É fácil nós, mães, esquecermos que a vida acontece no presente, seja trocando fraldas, controlando a febre ou passeando no parque. É agora a oportunidade de termos a presença dos filhos e sermos presentes para eles. Às vezes somos tentadas a viver para o futuro, imaginando que o trabalho de preparar refeições, levar ao médico, educar persistentemente é só um trabalho duro que queremos terminar logo para depois ficarmos livres. Mas não! Não estamos fazendo a parte difícil agora para depois vivermos. Estamos vivendo agora, construindo nossa relação de mãe e filhos enquanto trocamos fraldas, damos broncas ou fazemos qualquer outra coisa com e para eles. Estamos vivendo a parte mais importante! É em meio às tarefas triviais que os ajudamos a construir as memórias que terão de nós. E, muito mais que memórias, estão aprendendo conosco a serem as pessoas que serão.
No meu tom de voz, na minha paciência ou falta dela, na disposição ou indisposição para servir, estou ajudando minhas filhas a terem uma opinião sobre a maternidade e a família. Elas podem aprender a amar ou odiar isso.
Não. Não se trata apenas das memórias que minhas filhas terão de mim. Na maneira como exerço a maternidade e o cuidado com a família estou ajudando a construir futuros lares.
A sociedade do futuro será o reflexo das memórias dos nossos filhos. E, para o bem ou para o mal, as mães e os pais de hoje estarão lá.
Por Noeme Rodrigues de Souza Campos.
Publicado originalmente no website da Editora Ultimato, em 14 de fevereiro de 2020.
Notas da editoria:
Imagem da capa: “Hand in hand”, por Laurie Snow Hein.