Nosso objetivo é fornecer cultura, cultura de fato! Mas, o que é cultura?
Nenhum dicionário é tão eficiente que, além de lhe trazer a definição da palavra felicidade, lhe faça senti-la; e, sem senti-la, você jamais irá compreendê-la. Na verdade, para muitos termos, um dicionário servirá apenas para atestar ortografia ou divisões silábicas, para outras expressões poderá ser totalmente obsoleto.
O termo cultura é ainda mais complexo. Não é possível acondicioná-lo em poucos parágrafos com a eficiência de quem embala biscoitos em pacote. Afinal, se é inviável definir integralmente uma única pessoa de modo preciso, e inefável compreender sentimentos de outrem de modo totalmente eficaz, esclarecer sumariamente aquilo que conduz uma sociedade é impraticável, sendo possível, portanto, em ambos os casos, apenas obter recortes de determinados atributos que surgem, mudam ou desaparecem com o passar dos anos.
Cultura de Fato é um depósito para documentar tais recortes. Não é análogo a uma colcha de retalhos, é análogo a um quebra-cabeça do qual a quantidade de peças é indeterminada, e a significância de cada recorte não é dada pela dimensão física, mas pela longevidade.
Contudo, cultura não pode ser resumida como um conjunto de hábitos. Se assim fosse, não poderíamos qualificar povos como cultos ou incultos.
O conceito de cultura é tão amplo que, ao analisá-lo, existe uma enorme facilidade em substituir o real objeto da análise (cultura) por um fragmento dela (por exemplo: espetáculos artísticos), ou examinar um elemento (como a economia) ignorando que o respectivo alicerce esteja na cultura. Em analogia, tal estudo exige amplitude comparável ao trabalho de um restaurador de automóveis, que, ao lapidar uma peça, digamos, um para-choque, jamais poderá ignorar o veículo que irá recebê-la, do contrário, deixará a peça formosa, mas inútil.
Fatores como moda, política, economia, ética, religião, e artes unem-se à cultura como o mercúrio ao ouro. Os próximos parágrafos desfazem tais fusões, separam o valioso do prosaico, com o objetivo de elucidar o ponto de vista da Cultura de Fato sobre cada um destes temas.
Moda: compatibilidade cultural em ato; cultura em potência
Cultura não pode ser equivocada com moda. A primeira cultiva-se (é onerosa), a segunda, em muitos casos, descarta-se (pode ser fútil). No entanto, desvincular modas e hábitos de qualquer cultura faz tanto sentido como desassociar massa de concreto de edificações; chamar a carga de uma betoneira de imóvel é irracional, mas desconsiderar a potência que ela possui para solidificar-se e, em conjunto com outros materiais, compor uma residência, é estupidez. A moda de hoje, ontem era apenas compatível com a respectiva cultura, e amanhã poderá fazer um amálgama com ela.
Diante de tal argumento, para aceitar ou recusar modas é apropriado reduzir a ansiedade e ampliar o bom senso! Alguém que lhe deu “bom-dia” não é, por isso, necessariamente virtuoso; alguém que lhe pisou no calcanhar não o fez, necessariamente, por ser maligno. Portanto, se para qualificar uma pessoa é preciso avaliar os feitos e os anseios dela para depois compará-los com suas próprias diretrizes, com a moda, idem.
Porém, todos nós sofremos constantes influências, somos muito mais influenciados do que influenciamos, seja pela comunidade ou pela natureza. Por exemplo, devido à escassez de argila, temperatura média e grandes possibilidades de tufões, nos EUA residências construídas de madeiras são comuns. No Brasil, temos condições inversas, portanto, edificações de alvenaria são mais usuais. Para ser absolutamente pessoal, é necessário ter criado tudo e não ter sido concebido por nada – somente Deus.
Não espere, em Cultura de Fato, postagens que comparem estampas de vestuários que estejam na moda; artigos que conflitem casas de alvenaria com moradias de madeira; músicas que estejam nas paradas de sucesso para downloads ou exposições de receitas culinárias exclusivas. Nossa preferência será descrever essências, lastros e causas de “objetos”, não as exclusividades neles contidas. Não exporemos determinada música de estilo funk, mas poderemos articular quais os motivos que viabilizaram tal gênero.
Política, economia e ética: encarceradas pela cultura, libertas por ideologias de tiranetes
Cada cultura opera como o motor e o chassi sobre o qual a respectiva sociedade é movida, possui pujança que transcende o sistema político e econômico, pois, quando alguém opta por casamento monogâmico em detrimento do poligâmico, compra calça jeans para uso diário e quimono para bailes à fantasia, ou faz churrasco com carne bovina e sente asco por carne canina, faz tais escolhas em função da cultura. É mais fácil alterar as diretrizes financeiras de um país inteiro do que fazer uma pequena parcela da população adquirir e usar quimono, aceitar poligamia ou desassociar animais de estimação com petshops e associá-los com açougues. A cultura move a economia.
Eis uma enorme dificuldade do comunismo: demandar que a política, a economia e a ética sejam promovidas para a cátedra da cultura, afinal, uma nação não necessariamente precisa suportar uma única religião, um único linguajar e, enfim, ensejos únicos. Em um país de dimensões como as do Brasil, alguém nascido e criado na divisa com a Bolívia poderá ter traços culturais vistos aos olhos de um sulista como um estrangeiro. É por isso que sistemas socialistas não operam políticas alicerçadas nas respectivas culturas, mas buscam gerar novas culturas por meio de políticas.
Em suma, fazer com que alguém o ame cegamente é colocar este outrem de joelhos; forçar, criar ou dominar o cenário cultural é colocar uma sociedade inteira de joelhos.
Política, economia e ética agem dentro do cárcere da cultura. Olavo de Carvalho, de modo sumário e brilhante, colocou tais fatores em seus devidos lugares. Ele abriu o artigo: “O orgulho do fracasso“, publicado em 27 de dezembro de 2003, com o seguinte parágrafo:
“Língua, religião e alta cultura são os únicos componentes de uma nação que podem sobreviver quando ela chega ao término da sua duração histórica. São os valores universais, que, por servirem a toda a humanidade e não somente ao povo em que se originaram, justificam que ele seja lembrado e admirado por outros povos. A economia e as instituições são apenas o suporte, local e temporário, de que a nação se utiliza para seguir vivendo enquanto gera os símbolos nos quais sua imagem permanecerá quando ela própria já não existir.”
Na Cultura de Fato, não busque índices financeiros ou valores resultantes de corrupções ou transações lícitas. Em economia e política serão expostas ideologias, éticas, culturas e demais âmagos que serão implicados ou poderão sofrer sensibilizações em virtude de mudanças políticas ou financeiras – busque essências. E saiba que:
Cultura de Fato tem caráter conservador, crê em tradições e instituições que o tempo selou como benéficas, mas também acredita na possibilidade de poucos e específicos casos em que ajustes são necessários de tempos em tempos ou em condições específicas. Posiciona-se contrariamente a contraculturas como o marxismo; crê que governantes, quando buscam “ajustar” culturas, o fazem na imensa maioria das vezes em benefício próprio, portanto, defende o “Estado pequeno”.
Abraham Lincoln (1809 – 1865), que desejava ter sua imagem associada ao conservadorismo, proferiu: “O que é o conservadorismo? Não é a preferência pelo antigo e experimentado, acima do novo e do não testado?” Nós da Cultura de Fato acreditamos que sim.
Cristianismo: no ocidente, alicerce dos teístas aos ateístas
Caso este escrito fosse uma missiva, seria iniciado com as seguintes indicações: “São Paulo, 03 de junho de 2016”. Para despachá-lo, no envelope, mais referências seriam impressas, como o nome do bairro, Consolação, e a sigla do estado de São Paulo (SP).
Notoriamente, a cidade e o estado foram honrados com o nome de um dos apóstolos de Nosso Senhor Jesus Cristo. O nome do bairro também provém do cristianismo: trata-se de alusão com um dos muitos títulos de Nossa Senhora. A data baseia-se no calendário gregoriano, o qual, por solicitação do Papa Gregório XIII (1502 – 1585), foi elaborado por estudiosos como o jesuíta alemão Christopher Clavius (1538 – 1612). Na realidade, ao escrever qualquer coisa, existem outras dádivas provenientes do cristianismo, como as letras minúsculas e os espaços entre as palavras, que existem graças ao reinado do imperador Carlos Magno (742 – 814) e a seu empenho na retomada das artes, religião e cultura por meio da Igreja Católica, a chamada Renascença Carolíngia.
Assim, diferentemente do que muitos acreditam, a Igreja Católica foi além da invenção das universidades e da consolidação dos hospitais. Ela desenvolveu éticas defendidas secularmente por aliados e opositores, como, por exemplo, a ideia de ajudar aos necessitados sem expectativa de reciprocidade ou a defesa da vida. No mundo antigo, a prática do suicídio tinha inúmeros defensores, até mesmo em personalidades como Platão (378 – 377 a. C.) e Lúcio Aneu Séneca (4 a. C. – 65 d. C.). O primeiro disse que um pobre homem, cuja doença o tornasse incapaz de continuar a trabalhar, deveria ser abandonado à morte; enquanto Séneca escreveu: “nós afogamos as crianças que nascem débeis e anormais”.
No “quebra-cabeça” da cultura ocidental, o cristianismo não é apenas a maior das peças, é a diretriz e o tema de toda paisagem; assim, se Cristo não existiu, devemos admitir: fomos e somos majoritariamente bocós, bocós de rosca! Contudo, tal fato não é verossímil. Ninguém duvida que Aristóteles (384 – 322 a. C.) tenha existido, mesmo que tenha nascido quase quatro séculos antes de Cristo, da mesma maneira, ou ainda com mais afinco, nenhum historiador de renome suspeita que o homem dos evangelhos seja o principal personagem de uma fábula.
Por meio de diversos critérios, historiadores são capazes de determinarem a veracidade de que eventos tenham ocorrido em passado longínquo. Por exemplo, afirmações relatadas por fontes múltiplas e independentes sobre determinada passagem, remetem ao veraz. No livro “Deus não está morto 2”, de Rice Broocks, ele, o autor, relata: “no que se refere a Jesus Cristo, definitivamente tem havido um padrão mais elevado, às vezes irracionalmente alto, para estabelecer os fatos que cercam sua vida, suas obras e suas palavras”. Evidentemente não compete a este artigo expor documentos abissais, mas deve relatar alguma diretriz. No livro “Não tenho fé suficiente para ser ateu”, os autores Norman Geisler (1932 -2019) e Frank Turek abrem o nono capítulo com o tópico: “O evangelho de acordo com os não cristãos” o qual encabeça os seguintes incisos:
“No ano 66 d.C., os judeus da Palestina iniciaram uma revolta contra o governo romano, que, para dizer o mínimo, não agradou aos romanos. O imperador enviou tropas lideradas pelo general Vespasiano para conter a rebelião e retomar o controle das áreas rebeldes. Em 67, Vespasiano liderou um cerco à cidade rebelde de Jotapata, na Galileia. No 47º dia daquele cerco, um jovem revolucionário judeu optou por entregar-se ao exército romano, muito superior, em vez de cometer suicídio — um destino que muitos de seus compatriotas haviam escolhido. Aquele jovem recebeu o favor de Vespasiano e, depois, foi levado a Roma pelo general Tito, filho de Vespasiano; mais tarde, Tito destruiu Jerusalém e o templo judeu no ano 70 d.C.
Aquele jovem era Flávio Josefo (c. 37-100 d. C.) que, por fim, tornou-se o maior historiador judeu de sua época. Josefo começou a escrever documentos históricos em Roma, enquanto trabalhava como historiador do imperador romano Domiciano. Foi ali que escreveu sua biografia e duas obras históricas importantes. Uma dessas obras é sua atualmente famosa Antiguidades dos judeus [publicada em português pela CPAD], concluída por volta do ano 93. No livro 18, capítulo 3, seção 3 dessa obra, Josefo, que não era cristão, escreveu estas palavras:
“Nessa época [a época de Pilatos], havia um homem sábio chamado Jesus. Sua conduta era boa e [ele] era conhecido por ser virtuoso. Muitos judeus e de outras nações tornaram-se seus discípulos. Pilatos condenou-o à crucificação e à morte. Mas aqueles que se tornaram seus discípulos não abandonaram seu discipulado, antes relataram que Jesus havia reaparecido três dias depois de sua crucificação e que estava vivo; por causa disso, ele talvez fosse o Messias, sobre quem os profetas contaram maravilhas.”
Essa não foi a única menção feita a Jesus por Josefo”.
A divindade de Jesus Cristo também não é facilmente refutável, de tal modo que o título do livro de Geisler e Turek não exagera ao afirmar que é necessário ter fé assaz para não crer em Deus e, consequentemente, no Jesus histórico e no Jesus bíblico. Além do mais, objetos como o Santo Sudário permitem análises que vão além dos critérios históricos, enquanto a existência de Deus-Pai possibilita aplicar todas as áreas do conhecimento humano. Vejamos um exemplo extraído do artigo que recebeu o mesmo nome da obra de Geisler e Turek:
“Toda pessoa minimamente informada sabe que existe uma gigantesca probabilidade do universo ter surgido de um evento denominado Big Bang, mas poucas apreendem que antes deste evento não havia matéria, espaço e tempo, ou que tal teoria foi proposta por um padre jesuíta, doutor em astrofísica e amigo de Albert Einstein (1879 – 1955), Pe. Georges Lemaître (1894 – 1966).
Sendo altamente aceitável que a natureza (matéria, espaço e tempo) surgiram do nada, similarmente ao que está narrado em gênesis, não é plausível considerar a hipótese de que o Big Bang possa ter sido gerado por algo incorpóreo, atemporal e não causado, portanto, que transcenda a natureza?”.
Aristóteles dizia: “nada é aquilo com que as pedras sonham“, portanto, o que precedeu ao Big Bang é tão abordável pelas ciências quanto o sonho de um pedregulho, ao menos que este conceito vastamente aceito por ser repleto de evidências, não passe de um grande equivoco. De qualquer modo, o questionamento: “por que existe algo ao invés de nada?”, torna-se realmente relevante quando se compreende o nada, momento do qual é melhor abandonar o estudo da natureza e lançar-se no estudo da metafisica, ou seja, abandonar o cientista e buscar o teólogo! Como diria Albert Einstein: “A ciência sem religião é aleijada; a religião sem ciência é cega”.
Em suma, extrair o cristianismo da sociedade ocidental significa eliminar a identidade e as diretrizes desta civilização, assim, quando alguém questiona: “o que está acontecendo de errado com este mundo?”, independente da crença, muitas vezes está na verdade perguntando: “o que está acontecendo com a cultura cristã?”. Não é possível conservar nossa cultura descartando o cristianismo, não é possível descartar o cristianismo sem antes relativizar verdades seculares.
Cultura de Fato defende e crê no cristianismo, irá publicar estudos que demonstram o quanto a ótica cristã prosperou e prospera nossa civilização, apresentará também fatores que atualmente estão ocultos entre as massas, mas presentes entre cientistas, filósofos e teólogos, e que provocam enormes dores de cabeça em “ateístas profissionais”. No entanto, não ambiciona articular em nome da Santa Igreja, ou seja, publicará estudos apologéticos, históricos, apresentará artes-sacras e até mesmo fragmentos teológicos, mas não poderá servir de “guia espiritual”. Cultura de Fato também acredita que a atualidade nem sempre detém “o melhor” apenas por ser “o mais novo”; da mesma maneira que crê que o futuro não invalidará totalmente o presente, e que certas palavras jamais passarão.
Arte: espetacular receptáculo
Indesejavelmente, é natural que sensações sejam desencadeadas ao presenciar uma grande poça de vômito ou um acidente automobilístico; desejavelmente, muitas obras de arte atuais visam basicamente a despertar emoções. A “artista” britânica Millie Brown não é a única que prova a atual veracidade deste conceito sempre que bebe leite de soja com corantes comestíveis para, depois, literalmente, causar náuseas e vomitar sua “obra de arte”.
Em um saco plástico diversos objetos podem ser acomodados, mas, antes de serem depositados, torna-se necessário abrir e alargar a sacola. Parece que, atualmente, poucas artes são capazes de “alargarem” seu apreciador a ponto de melhorá-lo moralmente ou intelectualmente. Contudo, existem exceções.
No livro “A conversão da arte”, diversos ensaios da extensa obra de René Girard (1923 – 2015) foram reunidos, a contracapa conta com um DVD intitulado “O Sentido da História”, onde o autor mais o dramaturgo, filósofo e ensaísta francês Benoît Chantre discutem os pensadores e artistas dos séculos XIX e XX. O diálogo inicia-se com os seguintes dizeres de Girard:
“No plano europeu, a derrota de Lena é o equivalente do que ocorreu em Valmy, na França, três anos antes. É o fim do equilíbrio europeu no sentido do Antigo Regime. Napoleão vence o exército prussiano em duas ou três horas em Lena e o resultado é o desmoronamento da Prússia. O mesmo Napoleão vai retirar a Prússia do brejo onde estava atolada propondo ao rei uma aliança, que ele aceita. Contudo, o personagem de quem falamos no livro, Clausewitz, recusa essa aliança. E vai para a Rússia, entra para o exército russo que travará uma guerra contra Napoleão – a famosa campanha de 1812”.
Sem dúvida, o início da entrevista pode servir de conteúdo programático para um professor de história, o qual, caso desejasse estendê-la, poderia usar a Opus 49 de Pyotr Ilyich Tchaikovsky (1840 – 1893), denominada “Abertura 1812”. A minutagem desta composição forneceria todas as diretrizes, a qual poderia ser obtida mais lentamente ou mais rapidamente, de acordo com cada maestro. Em linhas gerais, resultaria em algo como:
- Ao inicio, violoncelos e violas solistas apresentam o hino ortodoxo “Deus Salva o Teu Povo”;
- Em breve e fortíssima passagem, próximo dos dois minutos, o aboé traz uma nova reflexão musical, respondida pelos violoncelos e contrabaixos;
- Próximo ou pouco depois do terceiro minuto, os metais começam expor o caráter militar contido na obra, que, menos de um minuto depois, expõe tema das forças russas, utilizando trompas e madeira acompanhadas por tambor em ritmo sistêmico, selando a ideia de âmbito militar;
- Por volta de cinco minutos depois do início, a iminência do ataque napoleônico é anunciada pela aparição do hino francês, A Marselhesa, apresentada pelos metais;
- Perto dos sete minutos, as cordas e as madeiras apresentam esperançoso tema;
- Aproximadamente aos oito minutos e meio, a música folclórica russa, “No portão, no portão do paizinho” é brevemente difundida pelo clarinete e pelas cordas; depois, é bruscamente quebrada com fragmentos de “A Marselhesa”;
- Por volta dos dez minutos e meio, novamente escutam-se temas esperançosos evocados por violinos e a retomada do tema folclórico, quebrados novamente pelos sons de um tenso ambiente de batalha, e, novamente, fragmentos de “A Marselhesa”; logo em seguida ouvem-se salvas de canhão, as quais podem ser reproduzidas por canhões reais;
- Próximo da conclusão da obra, aproximadamente aos treze minutos e meio, o triunfo russo é evidenciado pela retomada do hino ortodoxo, por badaladas de sinos e um grandioso tuti orquestral avigorado por banda militar;
- O hino “Deus Salve o Czar” conclui a obra de duração aproximada de quinze minutos.
Nesta obra, é inegável que a música ilumina o intelecto, moldando-o para receber uma parcela da história. Por outro lado, como já exemplificado, outras produções obscurecem a alma e “fecham” a mente. Nesta categoria, outro bom modelo foi exposto no livro “Como a igreja Católica Construiu a Civilização Ocidental”, do historiador Thomas E. Woods, na qual é citada a obra My Bed, da artista radicada em Londres Tracey Emin:
“Consistia em uma cama completamente desarrumada, onde se espalhavam garrafas de vodca, preservativos usados e roupas intimas manchadas de sangue. Em um dos dias em que a peça foi exposta na Tatte Gallery, em 1999, dois homens nus puseram-se a pular sobre a cama e a beber a vodca. Todos os presentes começaram aplaudir, persuadidos de que este ato de vandalismo fazia parte do quadro exposto”.
Woods também aponta outro importante aspecto: “o artista medieval, consciente de que seu papel era comunicar algo maior do que ele mesmo, normalmente não assinava as obras”. Com isso, o historiador alerta que, quando um artista perde a expectativa da transcendência de si e deste mundo, é natural que suas produções exprimam seus próprios sentimentos, lutas, emoções e idiossincrasia. Talvez este seja o motivo pelo qual “a cama da Sra. Emin” e o “vômito da Sra. Brown” sejam artes descartáveis como papel higiênico, enquanto a Capela Sistina e o nome de Michelangelo (1475 – 1564), sólidos como concreto.
Cultura de fato não pretende publicar obras que visem unicamente a despertar sensações. Pretende expor artes que sejam passiveis de traduzirem conhecimentos e, daí, enobrecerem almas e despertarem emoções. De tal forma, é evidente que arte sacra também terá espaço na Cultura de Fato.
Informação, conhecimento e tecnologia: moldes do conhecimento
Fale sobre chamas com duas crianças, uma que esteja informada sobre os riscos do fogo, e outra que tenha sofrido queimaduras. A diferença entre informação e conhecimento será clara.
Informação é como um acessório que pode ser esquecido e, talvez, seja perecível; conhecimento, uma vez adquirido, fará parte do ser, é irreversível como a inocência perdida. Talvez este seja o motivo pelo qual ninguém se torna mais inteligente apenas por ler jornais. Além disso, este e outros grandes meios de comunicação normalmente trazem um “pacote completo”: estatística, gráficos, depoimentos e demais recursos que trocam a capacidade de reflexão pela indução, sem contar com a sempre possível parcialidade da grande mídia. Contudo, a informação pode impulsionar, completar e induzir ao conhecimento, assim como fazem os aparatos tecnológicos.
Um garoto que faça admiráveis malabares com cadernos, lápis e diversas borrachas não tende apenas por tal façanha ser um grande escritor, da mesma maneira que uma criança que domine fantasticamente tablets, celulares e notebooks poderá utilizá-los apenas para absorver gigabytes de porcarias. Mais importante do que cultuar o uso de objetos é cultuar o que se produz ou a se extrai deles.
Adquirir cultura exige mais que obter informações, dominar tecnologias ou mesmo triunfar em determinada profissão. A pessoa culta conhece e busca culturas variadas, provê, encontra e conhece soluções para diversos problemas de diferentes ordens (culturas).
Os artigos postados na Cultura de Fato não almejam alvos similares aos publicados em colunas de jornais. Raramente terão “prazo de validade”. A prioridade, por exemplo, não são estatísticas sobre violência, mas as causas históricas ou idiossincráticas. Assim, Cultura de Fato, naturalmente, provê materiais para estudo, até mesmo nas seções “Atualidades” e “Notícias”, que não devem ser associadas a reportagens, mas a notificações sobre cursos, palestras ou acontecimentos que sirvam para reflexões.
Cultura e dignificação
Em 27 de julho de 2009, o Jornal Diário do Comércio publicou o artigo “A fonte da eterna ignorância”, o autor, Olavo de Carvalho, esclareceu que cultura deve ter a expectativa de tornar as pessoas mais inteligentes, mais sérias, mais adultas e mais responsáveis por suas ações e palavras. Também criticou as elites empresariais, políticas e militares, alertando sobre o fenômeno da degradação cultural brasileira. Escreveu: “A palavra “cultura” já evoca, na mente desse público, a ideia errada. “Cultura”, no Brasil, significa, antes de tudo, “artes e espetáculos””.
Olavo de Carvalho tem razão, cultura erudita tornou-se escassa, tão escassa que vale reafirmar: a palavra “cultura” é pouco útil no dicionário. Já a palavra “erudita” poderia ser eliminada, ao menos naqueles léxicos de bolso!
Cultura de Fato é um raro custodial de cultural erudita. E, se neste site não será possível embalar “conteúdos” com a eficiência de quem embala biscoitos, ao menos aproveite cada artigo como se fosse a última bolacha do pacote!
Escrito por Eric M. Rabello.
Texto revisado por Fabio Rabello.
Referências bibliográficas:
- Não tenho fé suficiente para ser ateu, por Norman L. Geisler (1932 – 2019) e Frank Turek.
- Deus não está morto 2, por Rice Broocks.
- Antiguidades dos judeus, por Flávio Josefo (37 ou 38 – 100 d. C.).
- A conversão da arte, por René Girard (1923 – 2015).
- Como a Igreja Católica construiu a Civilização Ocidental, por Thomas E. Woods.
- O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota, por Olavo de Carvalho.
- Coleção Bravo: Grandes compositores da Música Clássica, por Roberto Minczuk.
Notas da editoria:
Imagem da capa: “Colonel Acland and Lord Sydney: The Archers” (1769 – 1770), por Sir Joshua Reynolds (1723 – 1792).
Em adendo, assista a performance da Leningrad Philharmonic, por meio da obra número 49 de Tchaikovsky, “Abertura 1812”: