“A pior ditadura é a do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer.”
Ruy Barbosa (1849 – 1923)
Com a indicação de Flávio Dino, Lula mostra como o amor torna tudo mais lindo. Onde iria ele encontrar alguém mais simbólico da vitória do amor? Cuidadosamente, escolheu uma pessoa aplaudida por sua cordialidade e afabilidade, que muito contribuirá para amansar a conduta ouriçada de alguns senhores ministros… Ao mesmo tempo em que exibe à nação seu sólido compromisso com nossa liberdade de expressão, realiza o sonho de seu saudoso camarada Luís Carlos Prestes, que sempre quis ter um líder comunista raiz sentado no STF.
Os adversários que os comunistas mais combatem em suas dezenas de experiências mundo afora ao longo de 106 anos não são indivíduos, não são pessoas concretas com nome e sobrenome. Um Estado que adote o comunismo precisa eliminar ou silenciar grupos sociais inteiros. A força do Estado só eventualmente age contra “alguém”, pois seu alcance precisa ser “multitudinário”, para usar a palavra da moda após as prisões e julgamentos em massa referentes aos eventos de 8 de janeiro. Então, para o governo, é bom colocar no Supremo um jurista com essa visão pragmática de como a banda deve tocar.
Quero sublinhar três problemas que antevejo como decorrentes da indicação. O primeiro se refere ao ciúme que Flávio Dino vai suscitar. Como reagirá o ministro Alexandre de Moraes quando perceber que mão visivelmente mais pesada que a sua chega à Casa com ganas de provar serviço? Quem vai mostrar mais os dentes?
O segundo, diz respeito aos cidadãos bem-aventurados que têm “fome e sede de justiça” e consciência da importância dos tribunais superiores. Nestes muitos, se consolida a ideia de que não serão saciados por quem tem fome e sede de poder.
O terceiro diz respeito aos milhões que a elite política governante e sua torcida organizada gostariam de ver surdos e mudos, ou idiotizados no sofá da sala, assistindo à Globo. Digo isso porque não será fácil convencer o Senado que o ministro Flávio Dino é tão manso e pacífico quanto ele se revelará nas audiências com senadores e na sabatina final. Pode ser difícil aprová-lo e tudo que é difícil para o governo no Congresso custa caro para a sociedade. É nosso dinheiro ganhando asas e tomando rumo que gera as maiorias conseguidas pelo governo no parlamento. E não vejo motivos para que seja diferente no caso de Flávio Dino.
Isso é firmeza de caráter. A maioria móvel, hoje base do governo, tem seu padrão de conduta e não abre mão. Aliás, é sobre isso que escrevi desde que sentei para desabafar neste texto, usando sarcasmos e ironias para ser menos depressivo.
Por Percival Puggina.
Publicado no website do autor em 29 de novembro de 2023.
Nota da editoria:
Imagem da capa: “O ditador”, por Carmine Bellucci.