“É tradição da Esquerda julgar o sucesso humano pelo fracasso de alguns.
Isso sempre lhe oferece uma vítima a ser resgatada. No século XIX eram os proletários;
nos anos 60, a juventude; depois as mulheres e os animais; agora o planeta!”
Roger Scruton (1944 – 2020)
A reciclagem adquiriu um status moral quase que inquestionável, em grande parte porque crianças e adolescentes, doutrinados pela propaganda ambientalista continuamente regurgitada pelas escolas e universidades, chegam às suas casas munidos de informações falaciosas e as utilizam para intimidar seus pais. Não seria exagero algum dizer que mais de 70% da juventude quer que seus pais reciclem.
Porém, aqui vai meu humilde conselho aos pais: não se envergonhem e não se deixem intimidar! Joguem fora todo e qualquer lixo. Não há nenhuma virtude em reciclar algo que o mercado não está disposto a lhe pagar. Se reciclagem fosse realmente uma necessidade premente, tal ato teria um enorme preço de mercado, e as pessoas seriam pagas para incorrer em tal atividade. O que nossas crianças e adolescentes estão aprendendo nada mais é do que ideologia esquerdista, sem nenhum respaldo em fatos ou na ciência.
Um dos argumentos utilizados em prol da reciclagem é que o mundo está ficando sem aterros sanitários, pois o espaço para eles estaria acabando. Os meios de comunicação se esmeram em propagandear, principalmente em canais voltados para o público infantil, imagens sombrias de cidades soterradas sob seu próprio lixo. É exatamente isto o que se passa por educação ambientalista no mundo atual.
Porém, a realidade é que não há e nem nunca houve qualquer escassez de espaço para a construção de aterros. Se houvesse de fato tal escassez, o preço de mercado para tal espaço seria tão astronômico, que as pessoas estariam demolindo suas próprias casas para construir aterros em seus lugares. Ato contínuo, elas iriam embolsar o lucro e comprariam mansões. No entanto, a verdade é que se todo o lixo sólido a ser produzido nos próximos mil anos fosse concentrado em um único lugar, ele ocuparia apenas 114 quilômetros quadrados — o equivalente a 0,001% de toda a área dos EUA.
E o que dizer sobre a tão propalada alegação de que a reciclagem, principalmente a de papel, irá “salvar a vida” de várias árvores? Toda criança tem este mantra na ponta da língua. O papel, afinal, é feito da madeira das árvores. Por que não produzir papel novo utilizando papel antigo e, assim, evitar que mais árvores sejam derrubadas? Simplesmente porque não é assim que funciona a lógica econômica. A oferta sempre será comandada pela demanda. Se amanhã repentinamente pararmos de utilizar trigo para fazer pão, haveria menos trigo no mundo daqui a um ano. A oferta de trigo cairia drasticamente. Não mais haveria incentivos de mercado para se cultivar trigos, seus preços despencariam e o cultivo de trigo seria uma atividade totalmente deficitária. Da mesma forma, se todo o mundo parasse de comer frango, a população de frango diminuiria, e não aumentaria, como supõem quase todos os ambientalistas.
A mesma lógica se aplica à relação entre papel e árvores. Se pararmos de utilizar papel, menos árvores seriam plantadas. Não haveria incentivos de mercado para a conservação de florestas. Na indústria papeleira, 87% das árvores utilizadas são plantadas para a produção de papel. Isto significa que, de cada 13 árvores que seriam “salvas” pela reciclagem, 87 jamais seriam plantadas. É exatamente por causa da demanda por papel que o número de árvores plantadas no mundo aumentou nos últimos 60 anos. Eis, portanto, uma lição incômoda para os ambientalistas: se o seu objetivo é maximizar o número de árvores, não recicle papel. Outra lição: se você quer aumentar o número de árvores, defenda o capitalismo e a propriedade privada. Quando se é dono da sua própria terra, há vários incentivos econômicos para se cuidar muito bem desta sua terra. Sua preocupação é com a produtividade de longo prazo. Assim, o proprietário de uma floresta, por exemplo, irá permitir que uma madeireira ceife apenas um número limitado de árvores, pois ele não apenas terá de replantar todas as que foram ceifadas, como também terá de deixar um número suficiente para a colheita do próximo ano.
Outras declarações feitas por defensores da reciclagem são igualmente problemáticas. Reciclar não poupa recursos. Pelo contrário, desperdiça recursos valiosos. Em geral, reciclar é mais caro do que construir aterros, com a única exceção para esta regra sendo o alumínio. As crianças também são doutrinadas a acreditar que reciclar irá reduzir a poluição. Mas a elas não é dito que o processo de reciclagem é, em si, extremamente poluente. A reciclagem de jornais, por exemplo, requer que a tinta velha utilizada nos jornais seja retirada das páginas. Este é um processo quimicamente intensivo que gera enormes quantidades de lixo tóxico. Muito mais “ambientalmente saudável” seria simplesmente jogar os jornais fora.
Adicionalmente, um programa de coleta de recicláveis exige o uso de caminhões diferentes dos caminhões utilizados para a coleta de lixo comum. Isto, por sua vez, significa mais caminhões circulando diariamente (ou semanalmente) nas cidades. E isto, por sua vez, significa mais poluição do ar. Em Nova York, por exemplo, após instituir a reciclagem compulsória, a prefeitura teve de acrescentar duas coletas adicionais por semana. Já em Los Angeles, a prefeitura teve de duplicar sua frota de caminhões de lixo.
Mas o fato é que os recicladores têm uma agenda muito mais ambiciosa do que aquela com que doutrinam as crianças e os adolescentes. No livro Waste Management: Towards a Sustainable Society, seus autores, O. P. Kharband e E. A. Stallworthy, chegam a reclamar que as construtoras descartam pregos envergados e que os hospitais utilizam seringas descartáveis. “O chamado ‘padrão de vida’”, concluem os autores, “terá de ser reduzido”.
Eis aí o real objetivo da elite defensora de programas compulsórios de reciclagem. E, tragicamente, esta redução no padrão de vida já foi alcançada em várias cidades que construíram monstruosas e caras fábricas de reciclagem, o que levou a desperdícios inacreditáveis, impostos mais altos, e prefeituras financeiramente estropiadas.
A realidade econômica do debate ambientalista
Debates sobre questões ambientais nada mais são do que debates sobre como estamos precificando o futuro. Em economês, diz-se que estamos atribuindo ao futuro um valor presente muito descontado. Questões sobre “o mundo que estamos deixando para nossos filhos” e reclamações sobre a suposta miopia das gerações atuais são, em última instância, alegações de que estamos precificando o futuro de maneira incorreta e inapropriada — ou, mais especificamente, que estamos descontando acentuadamente o valor presente do futuro.
Em seu livro The Armchair Economist: Economics and Everyday Life, Steven Landsburg apresentou um excelente ponto sobre a alegação de que temos de conservar a terra para as gerações futuras. Ele pergunta como podemos saber com total certeza se nossos filhos e netos irão preferir uma floresta a toda a renda e riqueza que seriam geradas por, digamos, um estacionamento ou um shopping. E a resposta é que nós simplesmente não sabemos, pois, novamente recorrendo ao economês, é impossível fazer comparações interpessoais de utilidade. Mas podemos utilizar o princípio da preferência temporal para nortear nossas decisões.
Alguns dizem que não podemos precificar o futuro de maneira tão baixa — ou que, se o fizermos, deveríamos descontar seu valor presente de uma maneira extremamente ínfima. Tais pessoas argumentam que, ao fazermos nossos cálculos ambientais de hoje, as gerações futuras deveriam ser incluídas nele e consideradas como tendo o mesmo peso da geração atual. Certo, mas qual a consequência real e lógica de tal postura? Ora, se realmente fizermos isso para todos os assuntos envolvendo o ambiente, então qualquer questão sobre a proteção do planeta irá se tornar irrelevante por causa de um fato incômodo e perturbador já apontado pelo economista Walter Block: em algum momento futuro, o sol irá desaparecer, e o planeta com o qual estamos tão preocupados hoje irá simplesmente desaparecer. E isso é um fato para o qual não há alternativas.
Logo, se estamos tão preocupados com a preservação das espécies, e se já sambemos de antemão que, um dia, o planeta Terra irá inevitavelmente desaparecer, então temos de buscar um conjunto de ideias radicalmente distintas e uma abordagem radicalmente diferente da atual maneira de se pensar o ambiente. Temos de levar em conta que haverá um momento em que o principal problema ambiental a ser enfrentado pela humanidade não será como reduzir a poluição da terra, do ar e do mar, mas sim como sair deste planeta ou como alterar sua posição no sistema solar, duas tarefas que estão muito além das fronteiras da nossa atual capacidade tecnológica, mas que podem ser alcançadas, pelo menos em princípio.
Uma solução para este inevitável problema seria o acúmulo de recursos e capital, algo que requer um nível muito maior de criatividade e engenho humano, e uma divisão do trabalho muito mais acentuada que a atual, de modo que as pessoas possam se concentrar nos problemas e desafios gerados por uma viagem interplanetária. Isto significa que seriam necessárias mais pessoas habitando o planeta, e elas teriam de ser muito mais ricas do que são hoje, e teriam de enriquecer de maneira bem mais acelerada, pois isso liberaria o recursos necessários para solucionar todos estes problemas.
Embora isto — aumento populacional e enriquecimento acelerado — seja algo que vá exatamente contra as ideias ambientalistas convencionais, trata-se exatamente da consequência lógica de se dizer que as gerações futuras devem ser consideradas como tendo o mesmo valor da nossa geração atual. A tese de que não devemos dar ao futuro — e às gerações futuras — um valor presente descontado implica que todos os outros problemas atuais devem ser relegados a segundo plano, dando-se prioridade ao urgente problema de como impedir a inevitável extinção humana que irá ocorrer quando o sol morrer.
Conclusão
À primeira vista, o objetivo de se reciclar mais e de se conservar mais pode parecer muito apropriado, até mesmo desejável. No entanto, os defensores de tais práticas não possuem as informações econômicas necessárias para se tomar as decisões corretas nestas questões, pois não há direitos de propriedade claramente definidos sobre os recursos naturais escassos. Não há propriedade privada sobre aterros sanitários e não há livre mercado para a reciclagem de lixo. Adicionalmente, como mostra o exemplo de Block, se realmente nos importamos com as gerações futuras, se dermos a ela exatamente a mesma importância que damos a nós mesmos e, consequentemente, se estamos dispostos a nos sacrificar por ela — pois, afinal, damos a ela o mesmo valor que damos a nós mesmos —, então o inevitável fato de que o sol irá morrer um dia significa que, em vez de estarmos hoje preocupados com a reciclagem de lixo, deveríamos, isto sim, estar preocupados em construir colônias planetárias, exatamente como no seriado Battlestar Galáctica. Quem for contra isso, ou achar que se trata de um exagero, então tal pessoa realmente não está preocupada com as gerações futuras que presumivelmente irão habitar a terra daqui a vários bilhões de anos.
Recicladores e ambientalistas não são cidadãos melhores ou mais bem intencionados. São apenas mal informados. Quer salvar árvores e diminuir a poluição? Enfie seus papeis em uma grande sacola plástica e jogue-a fora.
Escrito por Roy Cordato.
Colaborou para este artigo Art Carden.
Publicado originalmente por Instituto Ludwig von Mises Brasil, em 28 de Maio de 2012.
O autor, Roy Cordato, é Vice-presidente para pesquisas e acadêmico residente da John Locke Foundation.
É também pesquisador adjunto do Mises Institute.
Notas da editoria:
1. Imagem da capa: “Landfill No. 5”, de Mikhail Rudnik.
2. Este artigo foi originalmente publicado na Cultura de Fato em 5 de dezembro de 2015. A data de 23 de abril de 2024 corresponde à última edição.