“Cada época é salva por um pequeno punhado de homens que têm a coragem de não serem atuais.”,
G. K. Chesterton (1874 – 1936).
Deus me fez no tempo.
No tempo estão meus limites: quanto vou viver e quanto posso ver – ver com os olhos e com a compreensão.
Cada época molda as lentes através das quais dá sentido à realidade. Assim, a maneira como vejo é focada, e desfocada, pelas lentes do tempo em que vivo.
O tempo é a janela através da qual olho o mundo. Nesse sentido, meu tempo é um ponto de vista – o ponto em que estou.
Não vivi o que outras gerações viveram. Mesmo que eu leia relatos do que se passou, não estive lá, não experimentei de modo abrangente o ponto de vista daqueles que estiveram. E eles, por sua vez, não puderam ver como eu e minha geração vemos. Somos todos limitados no tempo e espaço em que estamos.
Cada nova geração acha que tem uma melhor compreensão que a outra, o que pode até ser verdadeiro para o conhecimento acumulado a respeito daquilo que pode ser observado e medido repetidamente – medicina, tecnologia, por exemplo – mas não passa de crendice alicerçada na presunção quando o assunto são convicções – propósito da vida, valores ou como organizar a sociedade. As convicções são parte das lentes que nos ajudam a ver, e também distorcer, o que vemos.
Reconhecer as limitações no tempo é fundamental para qualquer tentativa de compreensão. A realidade é grande demais para minha breve existência. A complexidade da vida não cabe em minha janela, embora eu deseje profundamente o que está além dela. E não se trata de tentar ver por outras janelas, de outras épocas, mas de ansiar ver além de todas as janelas, ver o que está fora do tempo.
Trago, gravada em meu coração, a expectativa da eternidade – não como um desejo de viver para sempre, mas como um desejo de contemplar Aquele que criou o tempo e tudo o que existe. Ele é a Verdade completa, a Beleza absoluta da qual testemunha a natureza com seus vales, montanhas, flores, riachos e tudo que me encanta enquanto olho pela janela dessa breve existência.
Ele, graciosamente, entrou no tempo para nos contar de si mesmo e nos dar olhos e ouvidos para a eternidade. Deu-nos da sua vida, que é para sempre.
A eternidade inundou meus sentidos porque ele entrou no tempo e me deu olhos para ver! As coisas temporais se me apresentam sob a luz da eternidade. Há reflexos do Eterno em todas as janelas. Basta ter os sentidos despertos por sua graça.
Aguardo em suas promessas, para o contemplar, face a face, sem as cortinas do tempo.
Escrito por Noeme Rodrigues de Souza Campos.
Publicado originalmente no website da Editora Ultimato, em 5 de novembro de 2020.
Nota do editor:
A imagem associada a esta postagem ilustra recorte da obra: “O tempo”, criada pelo desenhista e pintor polaco Paweł Kuczyński.