“O presente é o ponto em que o tempo toca a eternidade.”
C. S. Lewis (1898 – 1963)
Uma das coisas que mais me faz pensar a vida é a eternidade. Pensar no Deus Eterno é pensar num ser que vive sem relógio. Por outro lado tornou-se impossível pensar na vida sem submetê-la aos ponteiros. Vivemos submetidos ao tempo. Fazemos as contas em todo final de ano do tempo que perdemos, do tempo que achamos que a vida parou, do tempo que desperdiçamos, do tempo que ainda temos, do tempo que diminui frente aos planos, do tempo que achamos que ainda teremos e do tempo que passou. Pensamos em nossos atrasos, nos dias que nos adiantamos, do relógio que despertou cinco minutos antes só para que pudéssemos ter um pouco mais de tempo de sono. Olhamos o tempo quando acordamos e determinamos que era o horário do café. Chegamos no trabalho e fazemos as contas de quanto tempo faltava para nosso expediente acabar. Nossa rotina foi submetida e determinada pelo tempo. E pra quem enfrentou o desemprego e começou a contar quanto tempo ficou desempregado? E quando a ansiedade bateu pensando em quanto tempo ainda ficaria? E ainda quanto tempo já passou assim e quanto tempo ficarei assim?
As perguntas que mais nos assombram em tempos acelerados não são as que não temos respostas, mas sim aquelas que dizem a respeito do tempo que temos. Independente da situação da vida em que cada um estamos todos nós pensamos unânimes no tempo, planejamos e gerimos nossas vidas a partir do relógio. Quando penso na eternidade, não penso no tempo que virá, mas penso que qualidade de vida me espera. Quando penso na eternidade de Deus, não penso em que tempo Deus vive, mas que qualidade de vida carrega consigo mesmo por Ele mesmo ser Eterno. A eternidade me faz pensar na vida e qualidade de vida porque eternidade em suma é vida abundante e em plenitude sem a variação do tempo. Deus é aquele que é, que era e que há de vir (Ap 1:4). Uma frase cronologicamente bagunçada, pois, pra mim submetido ao tempo, estou organizado no passado, presente e futuro e Deus se revela como presente, passado e futuro.
Que curioso, Deus é um ser sem relógio. Sua eternidade e sua vida eterna é condição de sua essência como qualidade de vida presente o tempo todo em todos os tempos por estar fora de todo tempo. Mil anos ou um dia (Sl 90:4) não faz diferença por não estar submetido ao tempo, mas porque todo tempo é agora por estar fora do tempo. Frente a isso o tempo pra nós se mostra apenas um: o agora. O passado virou história e memória. O futuro uma expectativa que aguardamos, mas que não temos. O presente é o tempo que de fato temos e onde nossas vidas se encontram. Será que de fato perdemos tempo? eu não sei. Será que estamos atrasados? Depende. Será que a vida parou quando deixou de ser “produtiva” (Quando o desemprego como um fantasma assombrou nossos sonhos)? Não sei calcular isso e muito menos responder. O que sei é que Aquele que é Eterno não tem relógio e me faz descansar a vida no agora sem ter medo de ter perdido tempo ou de pensar no quanto tempo falta, pois, quando penso qual é o tempo de Deus lembro-me da eternidade que pode ser desfrutada agora. Da próxima vez que olharmos a eternidade plantada em nossos corações (Ec 3:11) possamos nos lembrar não do tempo que não terá fim, mas da vida que tirou o relógio do pulso e parou de ser contada para agora ser de fato desfrutada.
A eternidade em nosso coração é um suspiro constante por qualidade de vida. Quando começarmos a olhar os ponteiros do relógio no presente lembremos que para desfrutar a eternidade é necessário tirar o relógio do pulso, pois, aquele que é só pode estar acessível em todo tempo e o tempo todo no agora. Hoje quando a sensibilidade para a vida nos despertar seja com o filho no colo, com um cafuné nos cabelos, num abraço dado, num café tomado, numa brisa no rosto, numa singela companhia, num pedalar de bicicleta, num caminhar na rua, num almoço ordinário em família ou rindo com os amigos, lembremos antes de tudo de tirarmos o relógio do pulso para que a vida seja revestida de eternidade no agora e não seja aviltada e limitada pelos ponteiros, pois, como disse C. S. Lewis: “O presente é o ponto em que o tempo toca a eternidade”.
Por João Pedro Vicente da Silva.
Publicado originalmente no website da Editora Ultimato, em 4 de janeiro de 2020.
Nota da editoria:
Imagem da capa: “End of time” (2018), por Robert Zietara.