“Um homem viveu, há séculos, no Oriente. E eu não posso olhar para uma ovelha, uma andorinha,
um lírio, um campo de trigo, uma vinha, uma montanha, sem pensar nÊle…”
G. K. Chesterton (1874 – 1936)
“Pensa no tempo que existiu antes de teres nascido. Verás como foste um puro nada em todo este abismo da eternidade. Que nada fizeste, nem algo podias fazer, para que obtivesses tua existência. E no tempo em que, devido unicamente à bondade Divina, existes, que coisa descobres em ti senão um nada, se deixas a Deus o que é de Deus e prescindes da Providência com que a cada momento Ele te está conservando? Pois não há dúvida alguma de que se Deus, por um instante sequer, se esquecesse de ti, imediatamente recairias no nada de que te tirou Sua mão onipotente. (…) Com este conhecimento justo de ti mesmo, ficas superior a quem quer que seja que, por cegueira, se julga ser algo.” 1
Nestas palavras do Pe. Lorenzo Scupoli (1530 – 1610) estão contidas algumas verdades que todos os grandes santos e todos os verdadeiros filósofos compreenderam prontamente: que é impossível pensar na verdade sem pensar na eternidade, que toda esta eternidade e toda a realidade criada não dependem de nós para absolutamente nada, e que todo conhecimento autêntico de si mesmo e do que quer que seja começa pela admissão da própria pequenez diante do todo e da circunspecção da própria ignorância.
Nestas linhas se encontram, simultaneamente, os princípios da vida cristã e os princípios socráticos da vida filosófica, que se mostram encantadoramente identificados: o amor e a busca pela verdade como um “aprender a morrer” e a sincera confissão das trevas em nós como meio de dimensionar adequadamente a própria estatura diante da luz do logos divino.
Por Daniel Marcondes.
Comentário originalmente publicado em nosso canal do Telegram.
Notas:
- Lourenço Scupoli. O combate espiritual e o caminho do paraíso. São Caetano do Sul: Santa Cruz – Editora e Livraria, 2019, pp. 97 e 98.
O livro em questão era lido constante e avidamente por São Francisco de Sales, que o recomendava a tantos quanto podia.
Nota da editoria:
Imagem da capa: “Touch of horizon”, por Leonid Afremov (1955 – 2019).