Qual é a diferença básica entre a Esquerda e a Direita?

Obra: "Le Serment du Jeu de paume" (década de 1790), por Jacques-Louis David (1748 – 1825).

Diferença crucial: na esquerda, as idéias corrompem as pessoas;
na direita, as pessoas corrompem as ideias.
Olavo de Carvalho (1947 – 2022)



Hoje existe uma grande confusão entre Esquerda e Direita.

Por exemplo, defender um capitalismo selvagem não significa que se é “de direita”. Por outro lado, defender uma maior intervenção do Estado na regulação da economia não significa necessariamente que se é da esquerda.

Há políticos que se dizem da Direita mas que na realidade não o são, porque “ser de direita” implica uma determinada visão do ser humano — e “ser de esquerda” implica outra visão, diferente, do ser humano. O que marca distintamente a diferença entre Esquerda e Direita, em um determinado indivíduo, é a forma como ele concebe o ser humano — e não a forma como ele vê a economia.

Um indivíduo de direita segue os princípios da cultura ancestral — conforme Mircea Eliade nos relatou nos seus livros de investigação antropológica — que se baseiam no conceito de “pecado original” que é comum a todas as culturas passadas e presentes. O ser humano é visto como um “anjo caído”, um “animal ferido” na sua origem ontológica, e o objetivo da política é o de suprir as lacunas dessa fraqueza originária humana mediante instituições fortes e que se fundamentem na herança histórica e na experiência do passado. O indivíduo de direita é um herdeiro de uma civilização, e ao mesmo tempo é o transmissor dessa civilização para as gerações futuras. Para um indivíduo de direita, a tradição é a condição do progresso.

Um indivíduo de esquerda recusa a herança da tradição porque acredita que o futuro é portador de maior felicidade e de sempre crescente liberdade, e considera o passado como limitador dessa felicidade e dessa liberdade. Para o indivíduo de esquerda, a política significa romper com a tradição em nome do progresso. Para a esquerda, o ser humano é um ser naturalmente bom (o “bom selvagem”, de Rousseau) e sem “pecado original”, que tende, pelo sentido da História, a um progresso em direção à perfeição (Historicismo, e o “progresso” visto como uma lei da natureza), sendo que considera que os “arcaísmos do passado” são obstáculos a ser removidos em função desse progresso rumo à perfeição do ser humano — e a política é vista como uma forma de libertação desse “passado arcaico”.

A forma como um indivíduo vê o grau de intervenção do Estado na economia está ligada à sua sensibilidade ética, e não ao fato de ser de direita ou de esquerda. Naquilo a que se convencionou chamar de Esquerda e Direita, existem pessoas com sensibilidade ética e outras que são eticamente empedernidas. Podemos encontrar brutos nas denominadas “Esquerda” e “Direita”, pessoas que são insensíveis aos sentimentos e emoções — assim como existem pessoas “duras de ouvido” e que não são sensíveis à música.

Assim, é possível a um bruto defender o totalitarismo de Estado, e a um outro bruto defender o capitalismo selvagem e o darwinismo-social. São, ambas, formas embrutecidas de ver a realidade, e que se prendem unicamente com a afirmação supremacista do princípio do interesse próprio.


Por Orlando Braga.
Originalmente publicado em 16 de janeiro de 2013, no website do autor.


Notas da editoria:

Imagem de capa “Serment du Jeu de Paume” (década de 1790), por Jacques-Louis David (1748 – 1825).


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