O apelido da mentira!

Obra: "Helter Skelter" (2014), por Wendell Well.

Moderação na defesa da verdade é serviço prestado à mentira.
Olavo de Carvalho (1947 – 2022)



Em 1942, durante a Segunda grande Guerra Mundial (1939/1945), os judeus poloneses ficaram confinados em guetos ou fugiram para evitar seu extermínio em campos de concentrações; foi quando a Alemanha invadiu a Polônia, a qual teve seu território dividido com a União Soviética (URSS).

A história conta que os judeus poloneses foram expulsos de lá e uma grande parte voltou para a sua terra de origem, terra que Deus lhes deu em possessão perpétua (Gn 48.4).

Um judeu, Salomon [nome fictício], saindo às pressas com malas, sacolas e sacos, levava um busto de Joseph Stalin, governante responsável pelos tristes acontecimentos não só para ele como para outros milhares, os quais foram exterminados em campos de concentrações.

Na fronteira um soldado russo lhe perguntou: “o que é isso que você está levando?” — Salomon disse: “Você deveria perguntar não ‘o que é isso’, mas ‘quem é esse’?” e esclareceu: “saiba que é o busto de um grande homem, que tem feito muito por esse povo sofrido: — o ‘camarada’ Stalin — vou levá-lo para dele não me esquecer.”

Aquele oficial aquiesceu deixando-o passar; ele seguiu viagem rumo à sua terra natal; chegando lá, novamente na barreira de identificação, ele foi detido e o fiscal israelense perguntou: “o que é isso que você traz consigo?” – disse ele: “você não deveria perguntar ‘o que é isso?’ mas sim ‘quem é esse’?” — a autoridade, então, reconheceu que teria que perguntar “quem é”, e assim o fez.

Respondeu ele: “esse é um ditador sanguinário, perverso, a quem devemos muito sofrimento em nossas vidas; milhares de conterrâneos não tiveram tempo de fugir e ficaram detidos em campos de concentrações ou foram mortos; trago-o para contar, a seu respeito, aos meus familiares e amigos e mostrar-lhes a sua fisionomia malévola!”

— “Pode passar, disse o fiscal, aqui há liberdade!”

Seu sobrinho que viera buscá-lo, ao sair dali em direção à rua, o ajudou a carregar a bagagem; chegando em casa o tio foi acomodando seus pertences sobre a cama, dentro de um armário e sobre uma cômoda.

Perguntou-lhe então o sobrinho: “quem é esse que você trouxe?” ao que Salomon respondeu: “você deveria perguntar ‘o que é isso’? e não ‘quem é esse!” [o jogo virou]; — mui respeitoso, o sobrinho indagou: “o que é isso?”, e o idoso tio lhe respondeu: “12 quilos de puro ouro!”

Destarte, a “meia-verdade” [apelido da mentira], por duas vezes, logrou êxito no seu intento de sair da URSS e chegar à sua terra de origem com uma riqueza bastante expressiva.

Coisas desse tipo têm sido suficientes para que muitas pessoas achem normal usar “meias-verdades” [apelido da mentira] em casos de riscos, de situações nas quais a verdade poderá complicar-lhes a vida.

Eu, há 22 anos, me encontrei assim, em uma “saia justa”; havia quatro “meias-verdades” que seriam normalmente aceitas; havia, todavia, a verdade integral, pura e cristalina, a qual, por certo, ser-me-ia prejudicial; ainda assim, optei por ela, que foi mui prontamente aceita sem desdobramentos desconfortáveis — aliás, pela Graça de Deus, fui elogiado; desde a infância, abomino a mentira.

Sabemos que a Palavra de Deus não esconde os erros, os malfeitos dos seus personagens, não os varre para debaixo do tapete, conforme já mencionei em anteriores ocasiões.

Temos, por exemplo, a história de Abraão que, em Gerar, apresentou sua esposa Sara como sua irmã e, ao ser descoberto, alegou que teve receio de informar ser ela sua esposa, pois poderiam matá-lo para possuí-la (Gn 20.1-18); era uma “meia-verdade” tendo em vista que Sara era, de fato, sua irmã, filha de seu pai.

A mesma situação aconteceu com Isaque, filho de Abraão, também em Gerar, que declarou que Rebeca, sua esposa, era sua irmã com receio de que fosse morto para possuírem-na (Gn 26.7); ainda assim, como ocorrera com seu pai, Isaque foi abençoado por Deus (v. 12).

“Deus não é homem para que minta!” (Nm 23.19) – na verdade, havia [há] da parte de Deus, unilateralmente, a respeito de Abraão, Isaque e Jacó [Israel] um pacto eterno [promessa] de fazer deles uma grande nação, dar-lhes uma terra em caráter perpétuo, e abençoar os que os abençoam e amaldiçoar os que os amaldiçoam [Gn 12.1-3, 7; 13.15; 15.18; 17.7-8; 17.21; 22.17-18; 24.7; 26. 3-4,24; 27.29; 28.14, Sl 105 5-11].

Há, no Novo Testamento, o fato de Ananias e Safira que venderam uma propriedade e combinaram reter uma parte, entregando apenas o restante aos pés dos apóstolos; Pedro lhes disse, em separado: “Não mentiste aos homens, mas a Deus” (At 5.2), e, ambos, ao ouvirem essa palavra, caíram mortos (v. 4).

Nesse episódio havia um pacto [unilateral] daquele povo de vender as suas posses e entregar tudo na Casa de Deus, com vistas a serem repartidas entre todos [At 2.42-47].

Devemos sempre nos lembrar o que afirmou o Senhor Jesus:

“Seja, porém, a tua palavra: sim, sim; não, não. O que disso passar vem do maligno” (Mt 5.37);
“… o diabo é mentiroso e pai da mentira” (Jo. 8.44).


Por Edmar Torres Alves.
Publicado originalmente no website da Editora Ultimato, em 26 de novembro de 2024.


Nota da editoria:

Imagem da capa: “Helter Skelter” (2014), por Wendell Well.


Leia também:



Artigos relacionados

5 1 vote
Classificação
Inscrever-se
Notifique-me sobre
guest
0 Comentários
 mais antigos
mais recentes  mais votado
Comentários
Visualizar todos os comentários
0
Adoraríamos receber sua crítica. Por favor, escreva-a!!x