Um todo que interage

Space, por Sanja Dota

As leis da natureza são apenas os pensamentos matemáticos de Deus.
Euclides de Alexandria (Século III a. C.)



Norris Clarke, que lecionou Metafísica e Filosofia da Religião por muitos anos na Universidade Fordham, distribuiu uma versão muito intrigante do Argumento do desígnio. Nós a apresentamos aqui de forma resumida e revisada, para sua reflexão.

Ponto de Partida. Esse mundo nos foi entregue como um sistema dinâmico e ordenado com muitos elementos ativos. A natureza desses elementos (propriedades naturais) é ordenada para interagir com outros em relacionamentos estáveis e recíprocos, que são chamamos de leis da Física. Por exemplo, cada átomo de hidrogênio em nosso universo está ordenado para combinar com átomos de oxigênio na proporção de 2:1 (o que implica que cada átomo de oxigênio está reciprocamente ordenado para combinar com átomos de hidrogênio na proporção de 1:2). O mesmo acontece com as valências químicas de todos os elementos básicos. E todas as partículas que possuem massa são ordenadas para mover-se em direção umas das outras, de acordo com as proporções fixas da lei da gravidade.

Em um sistema dinâmico, interconectado e interligado como esse, a natureza ativa de cada elemento é definida por sua relação com os demais. Isso pressupõe a existência de vários elementos para que haja inteligibilidade e capacidade de agir de algum outro.

Capa da obra: "Manual de Defesa da fé: Apologética Cristã", escrita por Peter Kreeft e Ronald K.A ciência contemporânea nos revela que nosso sistema mundial não é meramente um conjunto de leis distintas, separadas e não-relacionadas, mas um todo rigorosamente interligado, onde o relacionamento com o todo gera estrutura e determina as partes. Estas não podem mais ser compreendidas em separado do todo; a influência dele permeia todas elas.

Argumento. Em um sistema como o mencionado anteriormente (o nosso mundo) nenhum componente ou elemento ativo pode ser autosuficiente ou auto-explicativo. Isso porque cada parte pressupõe todas as outras; e todo o sistema já existe para combinar-se com suas próprias propriedades racionais. Nenhum elemento pode agir a menos que as outras partes estejam presentes para interagir reciprocamente com ele. Qualquer outra parte poderia ser auto-suficiente apenas se fosse a causa do restante do sistema— o que é impossível, uma vez que nenhuma parte pode agir exceto em colaboração com as demais.

Tampouco o sistema como um todo explica sua própria existência, pois ele é feito de partes componentes e não é um algo separado, existente em si próprio, independente do restante. Além disso, nem as partes nem o todo são auto-suficientes; e nenhuma parte pode ser tomada para explicarmos a existência atual de tal sistema de interação dinâmica.


Três conclusões


  1. Uma vez que as partes só têm sentido dentro do todo, e nem o todo nem as partes podem explicar sua própria existência, então um sistema como nosso mundo exige uma Causa eficiente unificadora que gere a existência de um todo unificado.
  2. Uma Causa desse tipo — que traga o sistema à existência de acordo com uma idéia unificadora — tem de ser uma Causa inteligente. A unidade do todo — e de cada uma das leis físicas cósmicas e globais, que fazem com que os elementos interajam entre si — é o que determina e correlaciona as partes. Portanto, esta unidade deve estar de alguma maneira presente como um fator efetivo e organizador.
    Entretanto, a unidade, a integridade do todo, transcende qualquer uma das partes; logo, não pode estar contida em nenhuma destas. Para estar realmente presente de uma vez só como um todo, essa unidade pode ser apenas uma idéia unificadora e organizadora. Isso porque apenas uma idéia pode manter juntos muitos elementos de uma única vez sem destruir ou mesclar os aspectos distintos de cada um. Isso é quase a definição de uma idéia. Uma vez que as partes estão espalhadas pelo espaço e pelo tempo, a única maneira pela qual podem estar juntas de uma única vez como uma unidade inteligível é dentro de uma idéia. Portanto, o sistema do mundo como um todo deve existir primeiro dentro da unidade de uma idéia. Uma idéia real não pode existir de modo operante e eficiente a não ser em uma mente verdadeira, que tenha o poder criativo de trazer tal sistema à existência. Portanto, para que haja um sistema universal ordenado (como é o nosso) precisa haver, em última instância, um Mente coordenadora e criativa. A ordem cósmica exige um Ordenador cósmico, que só pode ser uma Mente.
  3. Tal Mente ordenadora precisa ser independente do próprio sistema, ou seja, transcendente a ele, e não pode depender do sistema para existir e operar. Se dependesse do sistema ou de parte dele, teríamos de pressupor que este sistema como pré-existente para poder operar; ele teria simultaneamente que preceder a si mesmo e causar-se. Isso é absurdo! Nosso universo material exige necessariamente, como razão suficiente para a sua existência como um todo operante, uma Mente Criativa e Transcendente, que já existia e era capaz de operar antes e independe do sistema a ser criado.

Excerto da obra: Manual de Defesa da fé: Apologética Cristã,
escrita por Peter Kreeft e Ronald K. Tacelli.

(Central Gospel, ISBN 978-8576890652).


Notas da editoria:

Imagem de capa: “Space” (1844), da artista ucraniana Sanja Dota.




Em adendo, assista ao documentário intitulado “O ajuste preciso do universo”:


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Paulo Roberto Truchlaeff

“Argumentum ad ignorantiam”: não sabemos como o universo pode ser tão complexo e organizado. Então só pode ter sido criado por um deus! Aliás, qual deus? Essa crença pretende explicar o que ainda não sabemos em grande medida, mas apenas empurra a questão para mais além e a torna muito mais inexplicável. Deus seria incriado? Então o universo também poderia. Deus teria sido criado do nada? Então o universo também poderia.

Prezado, Paulo Roberto.

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