A vida cristã é um empreendimento mercenário?

Vela feita por moedas representando servidão ao dinheiro.

Excerto do primeiro capítulo da obra “O Peso da Glória”,
escrita por C. S. Lewis. Publicada pela Sociedade Religiosa Edições Vida Nova
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Vale salientar: este pequeno trecho contém uma acepção completa,

mas não demonstra o objetivo da obra ou do capítulo. Para tal finalidade,
assista ao vídeo disponível no término desta postagem.



Se você perguntasse a vinte homens íntegros dos nossos dias qual acreditam ser a maior das virtudes, dezenove responderiam: “abnegação”. Mas se perguntasse a qualquer um dos grandes cristãos do passado, diria: “amor”. Você percebe o que aconteceu? O termo positivo foi substituído por um negativo, e a importância desse fato transcende o campo da filologia. O ideal negativo de abnegação traz consigo, basicamente, a noção NÃO de procurar o benefício dos outros, mas de prescindirmos nós desse benefício, como se o importante fosse não a felicidade alheia, mas a nossa abstenção. Não me parece ser essa a virtude cristã do amor. O Novo Testamento tem muito a declarar sobre renúncia, mas não da renúncia como um fim em si. Ele diz-nos que devemos negar a nós mesmos e tomar a nossa cruz para poder seguir a Cristo. E quase todas as descrições da recompensa que se seguirá a essa renúncia contêm um apelo ao desejo natural de felicidade. Se hoje a noção de que é errado desejar a nossa felicidade e esperar ansiosamente gozá-la esconde-se na maioria das mentes, afirmo que ela surgiu em Kant ou nos estóicos, mas não na fé cristã. Na realidade, se considerarmos as promessas pouco modestas de galardão e a espantosa natureza das recompensas prometidas nos evangelhos, diríamos que nosso Senhor considera nossos desejos não demasiadamente grandes, mas demasiadamente pequenos. Somos criaturas divididas, correndo atrás de álcool, sexo e ambições, desprezando a alegria infinita que se nos oferece, como uma criança ignorante que prefere continuar fazendo seus bolinhos de areia numa favela, porque não consegue imaginar o que significa um convite para passar as férias na praia. Contentamo-nos com muito pouco.

Livro "O peso da glória", escrito por C. S. Lewis. Publicado pela Editora Vida.Não precisamos incomodar-nos com os incrédulos, quando dizem que essa promessa de recompensa transforma a vida cristã num empreendimento mercenário. Há vários tipos de recompensa. Existe uma recompensa que não se relaciona com os esforços que você faz para alcançá-la e é inteiramente alheia aos desejos que devem acompanhar esses esforços. O dinheiro não é a recompensa do amor; por isso chamamos de mercenário o homem que casa por interesse. Mas o casamento é a recompensa lógica da pessoa que ama, e essa pessoa não é mercenária por desejá-lo. O general que se distingue em combate na esperança de ganhar um título de nobreza é mercenário; o que se bate pela vitória não o é, visto que a vitória está para a batalha como o casamento para o amor. As verdadeiras recompensas não se adicionam simplesmente à atividade que premiam, são a própria atividade em consumação.


Extraído do livro: “O Peso da Glória”, escrito por C. S. Lewis (1898 – 1963).
Publicado pela Sociedade Religiosa Edições Vida Nova.
Tradução de Isabel Freire Messias.


Nota:

  1. Recentemente a Editora Thomas Nelson do Brasil republicou a obra: “O Peso da Glória”, sob ISBN número: 9788578600655.
  2. O livro é composto por nove capítulos, cada um refere-se a um sermão. O título do primeiro capítulo (sermão) intitula a obra.


Para compreender os fundamentos do livro assista ao vídeo de Beatriz Back. Trata-se de uma resenha da obra:

https://www.youtube.com/watch?v=T7sAAa1kVVc

Atente: O vídeo comenta uma republicação recente, realizada pela Editora Thomas Nelson do Brasil, enquanto o excerto desta postagem foi obtido por meio de uma edição já esgotada da Editora Vida. Os tradutores não são os mesmos, portanto, há diversas diferenças sutis.


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