Alguns dos pensamentos da obra “Meditações”, de Marco Aurélio

Obra: "Antique Capriccio with the Statue of Marcus Aurelius" (1784), por Hubert Robert (1733 - 1808).

*Meditações, compreende uma série de reflexões pessoais do
antigo imperador de Roma, Marco Aurélio (121 d.C. – 180 d.C.). É considerada uma das principais
obras filosóficas estoicas. Os escritos não foram concebidos para publicação; consistem em notas cujo
objetivo, ao longo de sua vida e principalmente durante o período em que dirigiu Roma (entre 161 e 180),
era claramente seu autoaperfeiçoamento.



Ainda que pudesses viver três mil anos e outras tantas vezes dez mil, ainda assim lembra-te de que ninguém perde outra vida além da que vive, nem vive outra além da que perde. Consequentemente, o mais longo e o mais curto confluem em um mesmo ponto. O presente, de fato, é igual para todos; o que se perde é também igual, e o que se separa é, evidentemente, um simples instante. Assim, nem o passado nem o futuro podem ser perdidos, porque, o que não se tem, como alguém nos poderia tirar? Tenha sempre presente, portanto, essas duas coisas: uma, que tudo, desde sempre, se apresenta de forma igual e descreve os mesmos círculos, e nada importa que se contemple a mesma coisa durante cem anos, duzentos ou um tempo indefinido; a outras, que o que viveu mais tempo e o que morrerá mais prematuramente, sofrem perda idêntica. Porque somente podemos ser privados do presente, posto que possuímos apenas o presente, e o que não se possui, não se pode perder.


Livro II, pensamento 14,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Não deves considerar apenas isso: que a cada dia se gasta a vida e nos sobra uma parte menor dela. Mas deves refletir também que, se uma pessoa prolonga sua existência, não está claro se sua inteligência será igualmente capaz, mais a frente, para a compreensão das coisas e da teoria que tende ao conhecimento das coisas divinas e humanas. Porque, no caso dessa pessoa começar a caducar, a respiração, a nutrição, a imaginação, os instintos e todas as demais funções semelhantes não lhe faltarão. No entanto, a faculdade de dispor de si mesmo, de calibrar com exatidão o número dos deveres, de analisar as aparências, de deter-se a refletir sobre se já chegou o momento de abandonar essa vida e quantas necessidades de características semelhantes precisarem um exercício exaustivo da razão, tudo isso se extinguirá antes. Convém, pois, apressar-te não somente porque a cada instante estamos mais perto da morte, mas também porque cessa com antecedência a compreensão das coisas e a capacidade de nos acomodarmos a elas.


Livro III, pensamento 1,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Considere sem cessar quantos médicos morreram depois de terem fechado os olhos repetidas vezes os seus doentes; quantos astrólogos, depois de terem previsto, como fato importante, a morte de outros; quantos filósofos, depois de terem sustentado inúmeras discussões sobre a morte ou sobre a imortalidade; quantos chefes, depois de terem matado muitos; quantos tiranos, depois de terem abusado, como se fossem imortais, com tremenda arrogância, de seu poder sobre vidas alheias, e quantas cidades inteiras, por assim dizer, morreram: Hélica, Pompéia, Herculanum e outras incontáveis. Acrescente também, um após o outro, todos o que conheceste. Este, depois haver tributado as honras fúnebres a aquele, foi sepultado em seguida por outro; e assim sucessivamente. E tudo em pouco tempo. Assim, examine sempre as coisas humanas como efêmeras e carentes de valor: ontem, germe; amanhã, múmia ou cinza. Portanto, percorra este pequeno lapso de tempo obediente à natureza e termine tua vida alegremente, como a azeitona que, madura, caísse elogiando a terra que lhe deu vida e dando graças à árvore que a produziu.


Livro IV, pensamento 48,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Não fiques insatisfeito, nem desanimes, nem fiques impaciente, se nem sempre for possível agir de acordo com retos princípios. Pelo contrário, quando fores menosprezado, recobre a tarefa com renovado ímpeto e fique satisfeito se a maior parte de tuas ações forem mais humanas e se amas aquilo ao qual, novamente, encaminhas teus passos, e não recorras à filosofia como a um professor de escola, mas como os que têm alguma enfermidade nos olhos se encaminham à esponja e à clara de ovo, como outro recorre à cataplasma, como outro à loção. Pois assim não te colocarás contrário à razão, mas, sim, repousarás nela. Lembre-se também de que a filosofia só quer o que a tua natureza quer, enquanto que tu querias outra coisa contrária à natureza. Porque, que coisa é mais agradável que isso? Não nos seduz o prazer por seus atrativos? Mas, examine se é mais agradável a grandeza da Alma, a liberdade, a simplicidade, a benevolência, a santidade. Existe algo mais agradável que a própria sabedoria, sempre que consideres que a estabilidade e o progresso procedem em todas as circunstâncias da faculdade da inteligência e da ciência?


Livro V, pensamento 9,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




O que não é prejudicial à cidade, tampouco prejudica o cidadão. Sempre que imagines que tenhas sido vítima de um mal, busque esse princípio: se a cidade não é prejudicada por isso, tampouco eu serei prejudicado. Mas se a cidade é prejudicada, não deves irritar-te com o que prejudica a cidade? O que justifica tua negligência?


Livro V, pensamento 22,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




A maior parte das coisas que o vulgo admira se referem às mais gerais, às constituídas por uma espécie de ser ou natureza: pedras, madeira, figueiras, vinhas e oliveiras. As pessoas um pouco mais comedidas tendem a admirar os seres animados, como os rebanhos de vacas, ovelhas ou, simplesmente, a propriedade de escravos. E as pessoas ainda mais agraciadas, as coisas realizadas pelo espírito racional, mas não o universal, e sim aquele que tanto é hábil nas artes ou engenhoso de outras maneiras (ou simplesmente capaz de adquirir multidão de escravos). Mas o que honra a alma racional universal e social não direciona seu olhar a nenhuma das demais coisas, e diante de tudo, procure conservar sua alma em disposição e movimento em acordo com a razão e o bem comum, e colabore com seu semelhante para alcançar esse objetivo.


Livro VI, pensamento 14,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




O semblante rancoroso é demasiado contrário à natureza. Quando se afeta reiteradamente, sua beleza morre e finalmente se extingue, de maneira que torna-se impossível reavivá-la. Tente, ao menos, ser consciente disso, na convicção de que é contrário à razão. Porque se desaparece a compreensão do agir mal, que motivo para seguir vivendo nos sobra?


Livro VII, pensamento 24,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




A arte de viver assemelha-se mais à luta que à dança no que se refere a estar firmemente disposto a fazer frente aos acidentes, inclusive imprevistos.


Livro VII, pensamento 61,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Apague as imaginações dizendo a ti mesmo continuamente: “agora de mim depende que não se instale nessa alma nenhuma perversidade, nem desejo, nem, em resumo, nenhuma perturbação; entretanto, contemplando todas as coisas tal como são, sirvo-me de cada uma delas de acordo com seu mérito”. Considere essa possibilidade de acordo com a tua natureza.


Livro VIII, pensamento 29,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Queres ser enaltecido por um homem que se maldiz três vezes por hora? Queres comprazer um homem que não se compraz a si mesmo? Compraz a si mesmo o homem que se arrepende de quase tudo o que faz?


Livro VIII, pensamento 53,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Capa do livro: "Meditações", de Marco Aurélio. Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).Tanto na omissão quanto na ação pode-se constituir uma injustiça


Livro IX, pensamento 5,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Tudo o que vês, muito em breve, será destruído; e os que presenciaram a destruição dessas coisas, dentro de muito pouco, serão também destruídos. De nada se avantaja quem morreu na velhice daquele que morreu prematuramente.


Livro IX, pensamento 33,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Como são os homens quando comem, dormem, quando dormem com uma mulher, e quando se entregam às necessidades animais! Logo, como são quando se mostram altivos e orgulhosos, ou quando se zangam e, apoiando-se em sua superioridade, humilham a outros. Há pouco tempo eram escravos de quantos senhores e por que motivos. E dentro de pouco se encontrarão em circunstâncias parecidas.


Livro X, pensamento 10,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Qual é teu ofício? Ser um homem de bem. E como se consegue sê-lo, a não ser mediante as reflexões, umas sobre a natureza do conjunto universal, e outras, sobre a constituição peculiar do homem?


Livro XI, pensamento 5,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9).




Deus vê as almas em sua pureza, livres de todos seus envoltórios materiais, de suas cascas e de suas impurezas; porque graças a sua inteligência exclusiva, tem contato só com as coisas que derivaram e emanaram dele, desde o princípio. E se também te acostumas a fazer isso, diminuirás muito os teus anseios. Pois o que não se dedica em atender o envoltório de carne que lhe circunda, não perderá tempo contemplando vestidos, casa, fama, ou outros adornos supérfluos.


Livro XII, pensamento 2,
Meditações, Editora Kiron (ISBN 978-85-8113-030-9)




Pequena síntese (e não excerto) criada pela Editoria da Cultura de Fato:


Sobre aceitação da natureza humana:
“É impossível que um homem morra sem ser prejudicado pelo que é próprio da natureza humana.”

Sobre controle de emoções:
“Não te deixes levar pelos sentimentos do momento. Mas, ao mesmo tempo, não cries problemas imaginários. Imagina-te muitas vezes num estado muito pior, e imagina que é o último que enfrentarás.”

Sobre vaidade e egoísmo:
“O orgulho é uma coisa extraordinária, que faz com que um homem se desagrade dos outros, mas ao mesmo tempo esperar que sejam eles a desagradar-se com ele.”

Sobre adversidade:
“A adversidade é como um vento forte. Se, porém, fores uma árvore, não te esquivarás dele; apanhá-lo-ás com raízes e tronco.”

Sobre a Importância da autenticidade:
“Não é que não aceitemos a verdade, mas o fato é que ninguém quer ser a pessoa a quem aquilo aconteceu. Aceita, portanto, a verdade e torna-te a pessoa que és.”

Sobre comtemplar a brevidade da vida:
“Tu dizes, ‘eu queria poder viver livre de preocupações.’ Mas como é que haverias de viver sem ter morrido primeiro?”




Nota da editoria:

Imagem da capa: “Antique Capriccio with the Statue of Marcus Aurelius” (1784), por Hubert Robert (1733 – 1808).


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