A Essência da Democracia

Obra: "Gran Circo" (1956), por Marc Chagall (1887 - 1985)

Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos.
Winston Churchill (1874 – 1965)

Democracia é a forma de governo em que o povo imagina estar no poder.
Carlos Drummond de Andrade (1920 – 1987)



Burocratas enfadonhos, políticos de índole suspeita e juízes autoritários defenderem a democracia com ardor e, em alguns casos, quase aos prantos, não passa de um teatro cômico, que se não nos faz rir é porque entendemos a tragédia que se encontra por detrás de todo esse histrionismo.

Manifestações grandiloquentes e apaixonadas, comumente apenas oferecidas aos deuses, a favor de uma mera forma de governo poderiam fazer-nos jurar que essa tal democracia se trata de um sistema perfeito, ofertado diretamente pelos céus, oriundo de uma mente superior.

Se há aqueles que exaltam a democracia com efusividade é porque têm a impressão de que ela existe para defender os valores da liberdade, da legalidade, da diversidade e da igualdade. Todavia, a democracia é tão empolgante quanto um emprego num cartório. Aliás, ela transforma mesmo o país em um grande tabelião, burocratizando tudo e impedindo, exatamente em defesa daqueles valores, que os poderes sejam eficientes e independentes.

Norberto Bobbio e Georges Bernanos (Imagem pequena com cantos esfumçados)Inclusive, esqueçamos aquela ideia pueril da democracia como o governo da maioria. É fato que nela há representantes eleitos, mas esse é apenas um mecanismo marginal de seu funcionamento. A essência do que a caracteriza está na forma como os poderes estabelecidos se relacionam. Nela, nenhum deles deve ter força absoluta. Todos precisam ser refreados, impedindo-se assim que seus atos tenham aplicação imediata e incontestável.

Os teóricos preferem chamar isso de harmonia entre os poderes, mas só posso concordar com eles se considerarmos que a fiscalização, o refreamento e o impedimento mútuos possam ser considerados expressões harmônicas de convivência.

Democracia nada mais é do que um conjunto de ferramentas disponíveis para tornar mais difícil qualquer ação política, pressupondo que o melhor é criar barreiras para evitar a centralização do poder do que arriscar submeter a sociedade a um tirano. Ela prefere à eficiência a segurança, entendendo que os males de um governo lento e burocrático são menores do que os de um governo ágil, mas possivelmente mau.

A democracia nada mais é do que o sistema da desconfiança. Não dá para se empolgar com algo assim tão restritivo. Posso preferi-lo, mas sem euforia. No fim das contas, concluímos que a democracia é simplesmente a escolha pelo mal menor diante dos riscos que as outras formas de governo representam. Ninguém pode, portanto, sentir-se tão empolgado em sua defesa e se alguém parece estar certamente será por fingimento.


Por Fabio Blanco.
Publicado no website do autor em 14 de fevereiro de 2023.

Fabio Blanco também é o responsável pelo domínio
http://www.filosofiaintegral.com.br/.


Notas da editoria:

Imagem de capa “Gran Circo” (1956), por Marc Chagall (1887 – 1985).


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