Milagres não quebram as leis da natureza

Obra: "Farmhouse Mountain Lake Nature", de Thomas Kinkade (1958 - 2012).

Excerto do capítulo 8 da obra Milagres, escrita por: C. S. Lewis (1898 – 1963).
Publicado pela Editora Vida, sob ISBN: 978-8573679588.



É incorreto definir milagre como sendo algo que quebra as leis da natureza, pois não é isso. Se bato meu cachimbo, altero a posição de inúmeros átomos: de modo geral, e numa proporção infinitesimal, de todos os átomos que existem. A natureza digere e assimila este acontecimento com a mais perfeita facilidade e num abrir e fechar de olhos, juntamente com todos os demais eventos. Trata-se de mais uma partícula de matéria-prima em que aplicar as leis, e elas se aplicam. Eu simplesmente lancei um evento na catarata geral dos mesmos e ele se enquadra perfeitamente ali e se conforma a todos os outros.

Se Deus aniquilar, criar ou desviar uma unidade de matéria, Ele criou uma nova situação nesse ponto. A natureza inteira imediatamente acolhe esta nova situação, faz com que ela se ambiente em sua nova esfera de atividade, e adapta todos os demais eventos à mesma. E ela passa a conformar-se com todas as leis. Se Deus criar um espermatozoide milagroso no corpo de uma virgem, ele não começa a quebrar quaisquer leis, mas estas de imediato tomam o controle. A natureza está preparada. A gravidez se instala segundo todas as leis normais e nove meses depois nasce uma criança. Vemos a cada passo que a natureza física não é absolutamente perturbada pela investida diária de acontecimentos oriundos da natureza biológica ou da psicológica. Se os eventos vierem de algum ponto além dela, a natureza também não será perturbada por eles. É certo que se dará pressa em alcançar o ponto de invasão, como as forças defensivas correm para um corte em nosso dedo, e ali se precipitará em acolher o recém-chegado. No momento em que ele entrar no reino dela irão obedecer todas as suas leis. O vinho milagroso é inebriante, a concepção milagrosa leva à gravidez, os livros inspirados sofrerão os processos comuns de corrupção textual, o pão milagroso será digerido. A arte divina do milagre não inclui a suspensão do modelo a que os eventos se conformam, trata-se, isso sim, de introduzir novos acontecimentos nesse padrão. Ela não transgride os dispositivos da lei, “Se A, então B”: mas diz: “Desta vez em lugar de A, A2,” e a natureza, falando através de todas as suas leis, replica: “Então 132” e naturaliza o imigrante, como sabe muito bem fazê-lo, pois se trata de uma anfitriã nata.

O milagre não é de forma alguma um acontecimento sem uma causa ou sem resultados. Sua causa é a atividade de Deus: seus resultados seguem a lei natural. Quando ela avança (i.e. no período que se segue à sua ocorrência) ele se acha interligado com toda a natureza como todos os demais eventos. Sua peculiaridade é que não se interliga igualmente em sentido retroativo, ligando-se à história anterior da natureza. É justamente isto que algumas pessoas consideram intolerável. A razão disso é que elas tomam a natureza como sendo toda a realidade, e estão certas de que toda realidade deve estar inter relacionada e agir de maneira consistente. Concordo com essas pessoas. O que acho, porém, é que elas tomaram erradamente um sistema parcial dentro da realidade, a saber, a natureza, como sendo o conjunto da mesma. Dessa forma, o milagre e a história anterior da natureza podem estar interligados afinal de contas, mas não da maneira esperada pelo naturalista: e sim, na verdade, de uma forma muito mais indireta.


Excerto do capítulo 8 da obra Milagres, escrita por: C. S. Lewis (1898 – 1963).
Publicado pela Editora Vida, sob ISBN: 978-8573679588.


Nota da editoria:

Imagem da capa: “Farmhouse mountain lake nature””, de Thomas Kinkade (1958 – 2012).


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