Tremula seu verde amazônico
Onde o amarelo-ouro destoa
Nos céus ouve-se um grito agônico
Pel’alva tempestade que ecoa
O último brasileiro sensato
Recebeu como dom profecia
Assim como João viu em Patmos
O fim de sua terra previa
“Salvem de Américo os quadros!
De Bilac e Castro Alves a fama!
Tudo está acabado,
Voltaremos à Pindorama!”
O povo, porém, não ouviu
O profeta que em versos contava
Tudo aquilo que viu
Enquanto o Senhor lhe falava.
“Encerro aqui, filho meu,
A existência de sua pátria amada;
Não há entre nós um dos teus
Que entenda o valor da jornada.”
Fogo e enxofre dos céus
Enquanto a terra boa rachou por inteiro
Ironicamente o atroz
Bem no mês de fevereiro
Quando quatro cavaleiros montados
Sobrevoavam o céu de Brasília
O povo, todo amontoado
Não pensou em findar a folia
Acabou-se tudo que é belo
Coragem, virtude e candura
Envergonham-se em Monte Castelo
Os pracinhas em sua bravura
No paraíso também
Desfalece Pedro II
Entregou o coração a quem?
Pobre país moribundo
O profeta poeta, cansado,
Morreu por não ser ouvido
Deus o recolheu pro céu
Antes de todo o acontecido
Não houve um só patriota
Que sofreu por seu gemido
E eu, que não fui arrebatado,
Sem a sorte do poeta cansado,
Vivo neste exílio moderno
Lutando pra burlar o inferno
Que a todos nós sentencia
Deságuo angustiado
De coração apertado
Enquanto o café esfria
Tudo aquilo que é engasgado
Que estava sufocado
Nesta estúpida poesia
Jogo as palavras fora
Perco tempo em demasia
E ainda vejo do alto
O anjo caído togado
Confirmando a profecia
Declamando como um rei
Anunciando a nova lei
Por todos os meios que havia:
“De nada adianta seu estudo
É melhor ficares mudo
Pois eu sou Democracia!”.
Por Douglas Alfini Jr.
Douglas é autor das obras Crônicas do Invisível (2021) e Âmbar Gris (2023):
Notas da editoria:
Imagem de capa: “A pátria” (1909), por Pedro Paulo Bruno (1888 – 1949).