Ortodoxia, de Chesterton

Obra: "Astonished at the World", de Timothy Jones.

Os poetas não enlouquecem, mas os jogadores de xadrez, sim.
G. K. Chesterton (1874 – 1936).



A revelação da Verdade


O livro Ortodoxia, de Chesterton, é uma contraposição ao espírito filosófico da modernidade; uma resposta à sua artificialidade e à sua insanidade. O próprio autor confessa que, em sua juventude, foi contaminado por essa maneira de pensar. Explica que tentou desenvolver sua própria compreensão da realidade; buscou desenvolver suas próprias teorias; e acreditou que poderia explicar, por si mesmo, a realidade.

Na verdade, muito do pensamento moderno nasceu da vontade de superar um filosofia alicerçada na Revelação; de mostrar que as ideias anteriores estavam tomadas de superstição; de que o homem não precisa de Deus para compreender a realidade; de buscar uma explicação para a realidade que fosse original.

O próprio Chesterton, usando a si mesmo como exemplo do espírito moderno, conta-nos que, no fervor de sua mocidade, também tentou ser original, desbravando realidades supostamente não abarcadas por ninguém. Como ele diz, criando sua própria heresia, da mesma maneira como fizeram todas as ideologias modernas, como também aquelas filosofias que tentaram explicar o funcionamento do mundo por meio de um princípio qualquer.

No fim das contas, Chesterton descobriu que suas descobertas não eram descobertas, mas verdades que já haviam sido reveladas. Quando ele pensou que havia encontrado novas explicações, percebeu que elas já haviam sido dadas pela revelação.

“Forcei minha voz com penoso exagero juvenil ao proferir minhas verdades. E fui punido da maneira mais adequada e engraçada, pois mantive as verdades: mas descobri, não que não eram verdades, mas simplesmente que não eram minhas.”

Recorte do Altar-Mor da Catedral de Notre-Dame em Paris, França (Tamanho Pequeno)Justino dizia que tudo o que já havia sido falado de verdadeiro, em todas as épocas, por todas as pessoas, pertence ao cristianismo. Chesterton está querendo transmitir a mesma ideia. Seu objetivo não é se opor à filosofia moderna, mas pontuar que ela não é original, pois seus acertos já se encontram todos naquilo que a “religião civilizada” ensinou.

O cristianismo, diferente das filosofias e ideologias modernas, não é uma versão da realidade, mas sua própria apresentação. Ele lança sobre nós o peso de existência inteira, do experimentável ao transcendente, o visível e o invisível, o imediatamente compreensível e aquilo que está além do que pode ser entendido atualmente.

Por isso, sentimos, neste mundo, uma dupla sensação, de familiaridade e perplexidade. Diante da infinitude que o cristianismo nos apresenta, ao mesmo tempo que convivemos com tudo aquilo que foi criado considerando nossa vida, tornando as coisas próximas de nós, temos de aceitar o incompreensível, o milagroso, o misterioso também como parte da existência.

“Como podemos imaginar ficarmos ao mesmo tempo assombrados com o mundo e, mesmo assim, nele nos sentirmos em casa?”

Diferente de boa parte do pensamento moderno que, partindo de princípios muito bem delineados, encontra explicação para tudo, fechando-se numa perspectiva lógica e hermética, o cristianismo abarca o conhecido e o desconhecido, fala daquilo que faz parte da vida comum, do homem simples, mas também dos milagres, dos grandes destinos. Isso porque não se trata de uma ideia, mas da realidade mesma, com sua amplitude e complexidade.” Ouvir” O cristianismo não é ter resposta para tudo, mas aceitar tudo como parte dessa existência bela e espantosa, às vezes com pleno sentido, outras completamente misteriosa.

Por isso que aquele que busca compreender a verdade não pode fechar-se em sua própria percepção do real, nem alimentar a arrogância de acreditar que pode, por si mesmo, entender tudo. Se for intelectualmente honesto vai perceber que muito daquilo para onde suas especulações conduziram já havia sido dado pela Revelação.

“Tentei fundar uma heresia só minha; e quando lhe dei o último acabamento descobri que era a ortodoxia.”

“Alimentei a fantasia de escrever um romance sobre um navegador inglês que cometeu um pequeno erro ao calcular sua rota e descobriu a Inglaterra.”

Chesterton, simplesmente, quer deixar claro que quem procura a verdade, com sinceridade, vai acabar se deparando com o que ele chama de Ortodoxia, que nada mais é do que a Revelação cristã. Afinal, toda explicação correta nela encontra abrigo.


Loucura da modernidade


Desde o Renascimento, houve uma tendência entre os pensadores de querer superar a “superstição” medieval. No fundo era um clamor por autonomia. Eles ansiavam por se ver livres das delimitações religiosas, dos princípios cerceadores do cristianismo e de uma filosofia norteada pela Revelação. Em consequência, surge a modernidade com seu otimismo em relação à capacidade humana de decifrar a estrutura da realidade. Os homens passaram a tentar, por si mesmos, entender o que é a existência. A experiência cartesiana nada mais foi do que o esforço por pensar sem o auxílio de qualquer elemento externo.

A filosofia moderna caracterizou-se pela autonomia de seu pensamento. Sem prestar contas de suas ideias a nada e a ninguém, eram diversas filosofias, cada uma apresentando sua própria versão da totalidade, sua própria concepção da existência. No entanto, para garantir sua independência, a filosofia moderna precisou negar os fundamentos da cultura onde estava inserida. Principalmente, rejeitou a Revelação como base de suas especulações. Preferiu seguir sozinha em sua busca por compreender a realidade. O problema é que “quem pensa sem os apropriados primeiros princípios fica louco”. Ter a si mesmo e suas próprias percepções como o início das especulações é uma característica mórbida. Por isso, Chesterton compara o pensamento da modernidade com o de um louco. As explicações modernas são tidas por ele como insanas, não porque não tenham nenhum sentido, mas talvez por terem sentido demais. Afinal, “os loucos são em geral grandes argumentadores”. Na verdade, uma característica típica de um pensamento lunático é ser eminentemente lógico. O louco costuma ser muito racional, até porque ele “não é alguém que perdeu a razão, mas alguém que perdeu tudo exceto a razão”.

G. K. Chesterton (Tamanho Pequeno)Além do mais, uma explicação insana costuma ser bastante harmônica consigo mesma e as filosofias modernas tendem a formar-se como sistemas totalmente coerentes com seus pressupostos. O problema é que é possível ser totalmente lógico e não condizer em nada com a realidade. “O louco costuma ter um raciocínio expansivo e exaustivo com reduzido bom senso”. Basta para isso que seus pressupostos estejam equivocados.

Essa lógica estrita faz com que os sistemas de pensamento das escolas filosóficas da modernidade movam-se de maneira circular. Isso é tipicamente insano, pois, quando o louco coloca a razão em andamento, ela se move em círculos. Suas explicações acabam sendo nada mais do que justificativas daquilo que ele mesmo propôs, meras racionalizações de seus próprios pressupostos. Por isso, tem-se a impressão que suas explicações são completas. Porém, quando se quebra esse raciocínio circular, percebe-se que muita coisa foi deixada de fora. Até porque “a explicação insana é tão completa como a do sensato, mas não tão abrangente”.

O resultado dessas características do pensamento moderno é sua evidente limitação. A partir do momento que ele se fecha dentro de seu circuito interno de raciocínios, torna-se incapaz de acessar e aceitar qualquer tipo de realidade não prevista ou não concebida. “A explicação insana esclarece muita coisa, mas deixa muita coisa de fora”.

Para isso, ele precisa ser reducionista. Suas concepções exigem ser simples para que tudo se encaixe em sua forma de conceber as coisas. Paradoxalmente, essa simplicidade passa a impressão de perfeição e as filosofias modernas se aproveitam disso para parecerem inequívocas. Porém, como “uma bala é exatamente tão redonda como o mundo, mas não é o mundo”.

Ao fechar-se em si mesma, a filosofia moderna torna-se obsessiva. Diferente do pensamento tradicional, que tende a ser amplo, o moderno costuma escolher uma perspectiva específica e agarrar-se a ela como um louco a suas manias. É um olhar concentrado, que busca a profundidade do que observa, mas que, por isso, esquece da totalidade que existe em volta. “Apresenta aquela combinação de um raciocínio expansivo e exaustivo com um reduzido bom senso. É universal apenas no sentido de que toma uma explicação superficial e a leva muito longe”.

Há, ainda, uma arrogância típica nas filosofias modernas, de quem confia demais em suas próprias proposições, sem nunca questionar se elas realmente são corretas. Até porque todas elas costumam apresentar-se como a resposta definitiva às questões a que se propõem. Essa autoconfiança exagerada é apontada, por Chesterton, com um indício da insanidade do pensamento moderno, pois “os loucos nunca têm dúvidas”. Sem esquecer que “os homens que realmente acreditam em si mesmos estão todos em asilos de lunáticos”.

Obviamente, o pensamento moderno tem seu valor. Nele, a natureza passou a ser investigada mais profundamente, desenvolveu-se um método científico e incentivou-se a especialização, o que permitiu uma compreensão mais detalhada dos objetos investigados.

No entanto, o objetivo de Chesterton é fazer um contraponto. Em seu tempo, a ciência e as filosofias da moda não precisavam de quem as defendesse, pois elas já eram louvadas como o ápice a que havia chegado a inteligência humana. O escritor inglês, então, pretendeu mostrar que essa autoconfiança talvez fosse o sinal de que houvesse uma boa dose de insanidade em tudo isso. A partir daí, ele apresenta os motivos porque entende que o cristianismo é superior a todo o pensamento moderno. Uma superioridade que vai ser encontrada exatamente naquilo que a modernidade tem como uma fraqueza: a aceitação do mistério.

O cristianismo não possui limitações auto-impostas, como o pensamento moderno. Pelo contrário, considerando a transcendência como participante da realidade, ao mesmo tempo que aceita o mistério, não se prende às amarras das explicações definitivas. Enquanto o moderno explica tudo, o cristianismo afirma que nem tudo pode ser explicado; enquanto o moderno pensa abarcar tudo, o cristianismo diz que há algo além do que experimentamos; enquanto o moderno busca prever tudo, o cristianismo se abre para novas experiências, ou seja, para o milagre. Para explicar essas diferenças, Chesterton faz uso de duas simbologias, a do círculo e a da cruz. “O círculo é perfeito e infinito em sua natureza; mas é fixo para sempre em seu tamanho; ele nunca pode ser maior ou menor. Mas a cruz, embora tendo no seu centro uma colisão e contradição, pode estender seus quatro braços eternamente sem alterar sua forma”.

Sendo assim, o cristianismo supera todo o pensamento posterior pelo simples fato de não apenas ir além dele, mas de também abarcá-lo. Toda a verdade da filosofia moderna é absorvida pelo cristianismo, apesar da verdade cristã não poder ser aceita pela modernidade sem que a modernidade negue a si mesma. “O cristão pode acreditar em alguma ordem no universo, já o materialista não pode admitir nada de espiritualismo”.

O cristianismo, por fim, vence porque não nega o transcendente. Pelo contrário, coloca-o como o princípio para a compreensão de todas as coisas, da mesma maneira que do sol vem a luz que ilumina tudo. Enquanto isso, “o intelectualismo independente é só brilho de lua”.


Guerra contra a razão


Quando abri o NEC, o objetivo era compartilhar, com quem se interessasse, minhas investigações teológicas e filosóficas. A proposta era oferecer reflexões mais profundas do que aquelas que comumente são feitas nas comunidades religiosas.

As abordagens tinham sempre um viés filosófico, mesmo quando os assuntos envolviam religião e espiritualidade. Sempre procurei manter um nível intelectual superior e mostrei para os meus alunos o quanto o cristianismo era uma proposta inteligível, perfeitamente compatível com análises racionais.

Fiz muitos amigos nessas aulas e trouxe para perto muitos companheiros antigos. No entanto, um deles sempre se negou a participar dos meus cursos. Não por ser despreocupado de assuntos intelectuais, mas porque, segundo suas palavras, a teologia não lhe interessava, afinal, ele era uma pessoa muito lógica.

Não sei se vocês conseguem captar o que está por trás do argumento do meu amigo. Segundo ele, estudos teológicos, que estão baseados em uma perspectiva religiosa e espiritual, não possuem a racionalidade mínima para satisfazer as necessidades lógicas de uma pessoa que valorize a inteligência.

Chesterton, certamente, identificaria, nesse meu amigo, o reflexo da forma moderna de pensar. No capítulo “O Suicídio do Pensamento”, do seu livro “Ortodoxia”, ele trata dessa característica que faz da modernidade arrogante e, ao mesmo tempo, contraditória.

O pensamento moderno enxergou-se como o ápice da racionalidade humana. O orgulho racionalista, cientificista e positivista eram evidentes. Ele realmente acreditou que havia superado a “superstição” medieval. De fato, seu objetivo era libertar-se das amarras do pensamento religioso. Ele queria ter autonomia para desenvolver, por si mesmo, as investigações para a compreensão das coisas. Para isso, escolheu abandonar as bases que sustentavam o cristianismo, como a Revelação e a religião.

Buscando o diploma (Tamanho Pequeno)No entanto, a modernidade não tinha como, simplesmente, negar os valores e princípios cristãos. Restou, então, para ela, replicá-los, porém, fragmentando a realidade que os sustentava. Levantou-se então contra o sistema de pensamento do cristianismo, não o negando, mas despedaçando-o.

O problema é que essa fragmentação do cabedal intelectual cristão, em vez de conduzir o pensamento humano para uma racionalidade superior, fê-lo tresloucado. Isso porque “quando um sistema religioso é estilhaçado (como na Reforma), não apenas os vícios que são liberados, mas as virtudes também são liberadas”. As ideias cristãs permaneciam vivas, mas agora, isoladas, passaram a vagar, sem rumo, no mundo. Isso fez com que ele ficasse “cheio de velhas virtudes cristãs enlouquecidas”.

Todavia, essa arrogância não foi apenas uma busca por independência, mas, por mais estranho que pareça, representou uma verdadeira revolta contra o excesso de razão escolástico. Sim, a modernidade, que se apresentou como a superação da superstição medieval, na verdade, estava apenas se levantando contra seu racionalismo.

Isso porque os intelectuais da Idade Média desenvolveram um sistema extremamente racionalizado de pensamento, o que só foi possível porque o cristianismo é uma religião essencialmente racional por ser uma revelação da realidade, a ser compreendida de maneira inteligente pelos homens; apresentar uma proposta que, para se tornar eficaz, depende de que o indivíduo a aceite racionalmente; conter diversos elementos moralizadores que são reflexo de uma doutrina, o que exige uma coerência lógica entre esta e o regramento que lhe segue. Inclusive, nas Escrituras, o próprio Messias é identificado com o Logos, que na filosofia grega representava a Razão. Essa relação é tão íntima que, não por acaso, “na medida em que a religião já desapareceu, a razão vai desaparecendo”.

O cristianismo nunca poderia ser um inimigo da razão, mas era necessário que fosse fiel a ela. A sobrevivência da religião sempre dependeu da manutenção de sua racionalidade. Esse é o motivo por que a religião católica (e mesmo a protestante) desenvolveu sistemas rígidos de proteção à coerência da fé. As inquisições, concílios e confissões existiram exatamente para proteger a inteligibilidade daquilo que era pregado, buscando impedir, com isso, que a religião se desvirtuasse em uma afronta ao pensamento. “Os credos e as cruzadas, as hierarquias e as horríveis perseguições foram organizadas para a difícil defesa da razão. São todas sombrias defesas erigidas em volta de uma autoridade central – a autoridade do homem de pensar”.

O fato é que, sendo o cristianismo uma expressão da própria realidade, comprometido com a verdade em sua inteireza e, por isso, completamente dependente da razão, qualquer tentativa de superá-lo não poderia culminar, por mera impossibilidade lógica, em algo superior, mas só poderia acabar, apesar de sua arrogância, em um tipo de racionalidade inferior.


Democracia dos mortos


Desde Platão, homens eruditos imaginam formas de governo que possam dar ordem à sociedade, para que ela funcione de maneira harmônica e eficiente. Idealizar os sistemas políticos passou a ser uma atividade corriqueira dos intelectuais.

Com isso, tornou-se lugar-comum a concepção de que se a sociedade é organizada de determinada maneira é porque homens inteligentes a configuraram dessa forma. Até mesmo a democracia acabou imaginada assim, como sendo um sistema pensado, desenhado em algum gabinete de um expert qualquer.

Punhos CerradoA democracia foi transformada em ideologia.

Chesterton, porém, deu uma conotação diferente à democracia, entendendo-a como o respeito às ideias preservadas pelos homens comuns de todas as épocas.

Por isso, ele vai conceber a Tradição e a Democracia como sendo uma única e mesma ideia, inclusive denominando aquela como “a democracia dos mortos”.

Na visão de Chesterton, é muito mais saudável ouvir o que os homens comuns sempre disseram do que dar atenção às ideias mirabolantes dos intelectuais.

O que o pensador inglês propõe é que a vontade da maioria, que é a característica elementar da democracia, seja estendida para além do presente, mas considere o que aqueles que já viveram nos legaram. Afinal, nisto estaria o verdadeiro conhecimento.

A verdade é que Chesterton tinha plena convicção de que ideologias não são combatidas com mais ideologias, por isso, em vez de afiliar-se a uma proposta social qualquer, preferiu abrigar-se no bom e velho senso comum.


A vontade que sustenta o mundo


A partir do momento que os pensadores desapegaram-se da Revelação para investigar a natureza por conta própria, tornaram-se obsessivos por descobrir a lei subjacente que a sustenta. O objetivo era desvelar o processo que está por trás de tudo, que faz o mundo ser o que é e que demonstraria que Deus realmente não seria necessário.

Para isso, porém, era preciso que sua filosofia concebesse o cosmos como uma máquina, permitindo assim decifrar seu funcionamento, tornando tudo previsível, sem a preocupação de saber se há alguma inteligência por trás com o risco de tomar decisões inesperadas. Até porque o que mais incomoda a inteligência moderna, ansiosa por autonomia, é aceitar que possa haver porções da existência que sejam inexplicáveis, imprevisíveis, misteriosas. Aceitar que talvez ela dependa, no fim das contas, de uma mente que age como e quando quer lhe é aterrorizante.

Space, por Sanja Dota (tamanho pequeno).Chesterton então toma essa busca por segurança dos cientistas e lança na cara deles que seus esforços são vãos, afinal, nada garante que exista uma lei que sustente toda a realidade. Ele observa que apenas testemunhamos uma mera repetição de fenômenos, e isso, seguindo o próprio rigor científico, não caracteriza uma lei, pois lhe falta um elemento crucial, que é a existência de uma inteligência que lhe determine. Leis são atos de vontade e chamar a mera repetição de acontecimentos de lei não passa de um eufemismo.

A repetição, em vez de indicar que o mundo possua um padrão impessoal e autônomo, insinua que é mais provável que haja uma inteligência determinando que as coisas ajam sempre da mesma maneira. Até porque a recorrência contínua costuma ser uma prova de que há vida envolvida no processo e não uma mera sucessão mecânica. Por exemplo, para acordar todos os dias, no mesmo horário, pela manhã, é preciso que diariamente se tome uma decisão nesse sentido. A repetição exige vontade.

Chesterton insiste que a reiteração dos fenômenos na natureza parece muito mais fruto do querer e do agir de alguém do que de um processo sem vida. Isso não significa que ele estivesse querendo impor uma nova filosofia, nem destruir a ciência. Seu objetivo era apenas ressaltar que aquilo que os cientistas chamam de lei da natureza não precisava ser, necessariamente, uma negação da vontade sustentadora de Deus. Pelo contrário, poderia ser exatamente a prova dela.


Por Fabio Blanco.
Publicado no website do autor entre março e abril de 2022.


Nota da editoria:

Imagem de capa: “Astonished at the World”, por Timothy Jones.




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